Empresas que encaram o desafio do comércio exterior se tornam mais competitivas e encontram novas oportunidades. O programa INTERCOMP, da FIESC, ajuda pequenas e médias indústrias a trilhar o caminho com sucesso.
Com negócios em mais de 45 países, que correspondem a um terço de um faturamento que em 2020 bateu na casa dos R$ 100 milhões, a Indumak Máquinas começou a exportar na virada do século, após quase quatro décadas de atividade. Hoje, o diretor-presidente da empresa de Jaraguá do Sul, Célio Bayer, não mede palavras para descrever o que esse passo representou para a companhia de 200 funcionários. “Passar a exportar foi o grande divisor de águas. Quando se parte para a internacionalização, a empresa entra em outro conceito de negócio. Ela precisa se modernizar, se adaptar constantemente. O faturamento cresce, mas o principal é que a qualidade do produto e a capacitação da equipe também cresçam muito. A empresa se torna muito mais sólida e estável, menos sujeita a crises”, enumera Bayer.
A Indumak foi uma das indústrias do Estado que aceitou participar, em meados de 2018, do projeto-piloto da Avaliação de Maturidade do Programa de Internacionalização da Indústria de Santa Catarina, o INTERCOMP. A ferramenta, um questionário com 25 perguntas que pode ser respondido de forma on-line, com retorno imediato do resultado, é o primeiro passo para empresas interessadas em utilizar os serviços e a expertise oferecidos pelo programa.
O programa foi criado para disseminar a cultura de internacionalização e apoiar as indústrias em suas iniciativas de exportação, importação ou formação de parcerias. O pano de fundo é a competitividade: como aconteceu na Indumak, a inserção internacional exige a elevação dos patamares de eficiência, qualidade, produtividade e inovação. “Não importa o tamanho de uma empresa: a internacionalização é um passo possível, que vai aumentar a competitividade e gerar uma série de novas oportunidades, além de tirar a empresa de um lugar de acomodação: ela precisa lidar diariamente com uma concorrência bem diferente”, afirma Maria Teresa Bustamante, presidente da Câmara de Comércio Exterior da FIESC e coordenadora do INTERCOMP.
A indústria catarinense tem tradição em comércio exterior, e atualmente o Estado é o oitavo em exportações no País, com participação de cerca de 2.300 empresas e valores acima da casa dos US$ 8,1 bilhões em 2020. No caso das importações, Santa Catarina ocupa a terceira posição, tendo realizado US$ 16 bilhões no ano passado. Ainda é baixo, entretanto, o número de indústrias de pequeno porte no processo, por isso elas são o foco do programa da FIESC, especialmente no caso das exportações.
O alcance do INTERCOMP
- AÇÕES EM 2020
- 363 empresas realizaram Avaliação de Maturidade
- 19 webinars
- 5 rodadas para os setores de alimentos e bebidas, chocolates, cosméticos e produtos de higiene e madeira
- Atendimento de 63 empresas dentro do programa Go To Market e realização de 17 eventos on-line para capacitações
- Mais de 40 estudos de inteligência comercial
- AGENDA PARA 2021
- Eventos on-line nas 16 vice-presidências da FIESC
- 18 capacitações em comércio internacional on-line
- 17 eventos de promoção de negócios no exterior – missões internacionais e rodadas de negócios
- Participação no programa Go To Market versão 2021
- Atendimentos customizados e continuados de Inteligência Comercial e Certificados de Exportação
Fonte: FIESC
Inteligência | Para exportar e importar, é preciso antes de tudo desvendar as leis e normas que regem o comércio exterior, além de estudar com cuidado cada mercado almejado: sua cultura, logística, concorrentes e clientes em potencial. “O empresário que quer exportar precisa combater o imediatismo e entender que o mercado interno e externo tem regras e exigências diferentes. A falta de conhecimento pode custar caro, seja por causa de multas e penalidades ou por tentar entrar em um país sem conhecer direito a realidade de mercado”, argumenta Bustamante.
Somente em 2020, 363 indústrias catarinenses realizaram a Avaliação de Maturidade, número que deve crescer a partir do lançamento da plataforma digital do INTERCOMP (internacionalizacao.fiesc.com.br), ocorrido no último mês de outubro. O ambiente virtual, que pode ser acessado por vários integrantes da mesma empresa, apresenta todas as ferramentas disponíveis no programa. Cada empresa pode contratar a elaboração de um plano de ação customizado, além de estudos de inteligência comercial, rodadas de negócios, cursos de capacitação e webinars, além de auxílio completo na emissão de documentos e certificados.
No ano passado, a equipe do programa realizou mais de 40 estudos de inteligência comercial para diferentes setores industriais de Santa Catarina. Um deles foi solicitado pela Indumak. A indústria jaraguaense conta atualmente com o INTERCOMP para entender o mercado do Canadá, para onde ainda não exporta. “Até hoje eles nos ajudam a desvendar mercados e segmentos. Primeiro questionaram o motivo pelo qual não estávamos na Europa, e, agora, estamos dando início às operações em Portugal e na Espanha. Também nos ajudaram a entender o mercado mexicano, onde não vendíamos tão bem até pouco tempo”, relata Bayer, referindo-se ao trabalho dos consultores do programa.
Resultados | Se funciona para indústrias já consolidadas, o programa também vem cumprindo seus objetivos junto às pequenas e médias empresas: dados do Ministério da Economia apontam um crescimento de 20% no número de empresas exportadoras do Estado (veja o quadro na página anterior). Os cases que ilustram esta reportagem apontam as mudanças culturais vivenciadas pelas empresas e os primeiros resultados obtidos.
Para 2021, o calendário prevê 18 capacitações on-line em comércio internacional e 17 eventos de promoção de negócios no exterior. O INTERCOMP também é parceiro do Sebrae, no programa Go To Market (https://promo.sebrae-sc.com.br/go-to-market). O projeto, que tem cerca de 100 micro e pequenas empresas participantes, é composto de Avaliações de Maturidade e planos de ação, além de palestras, lives e workshops.
SERPIL - Criando uma cultura exportadora
Empresa de Pinhalzinho desvincula estratégia exportadora do câmbio, com foco no longo prazo - Foto: Divulgação
A Serpil Móveis, de Pinhalzinho, voltou ao mercado externo há cerca de seis anos. Até meados dos anos 1990 a empresa exportava para alguns destinos, mas o câmbio apreciado do Plano Real praticamente inviabilizou a empreitada. “Agora trabalhamos com um projeto de longo prazo, desenvolvendo uma cultura exportadora. Estamos desvinculando a estratégia da questão cambial e focando no desenvolvimento de produtos diferenciados, parcerias fortes e diversificação do mercado”, diz Cristian da Cunha, gerente de importação e exportação da Serpil.
O primeiro cliente na nova investida foi o Reino Unido, um sólido parceiro da indústria moveleira brasileira. Em seguida foram iniciadas negociações na América do Sul. No Uruguai, através de um trabalho de inteligência comercial que ajuda a identificar os players no país, a empresa está obtendo um bom retorno com a venda de colchões.
Atualmente, os Estados Unidos respondem por 60% das vendas para o exterior, que passaram de um esporádico contêiner por semestre, sete anos atrás, para 15 por mês. O volume corresponde a pouco mais de um terço da produção total da empresa de 300 funcionários. O objetivo é chegar, em breve, aos 30 contêineres por mês.
Os produtos exportados costumam ser vendidos para distribuidores que os revendem em marketplaces como Amazon e Wayfair (e-commerce norte-americano especializado em móveis), bem como grandes varejistas. “No exterior, cerca de 70% dos nossos produtos são vendidos ao consumidor final de forma on-line. Por isso, temos que diminuir ao máximo a possibilidade de qualquer defeito, já que os clientes avaliam tudo de forma instantânea nesses marketplaces”, afirma Cunha.
O foco no comércio exterior promoveu mudanças profundas na empresa. Levou, por exemplo, à criação de um departamento interno para desenvolver produtos e à implementação de metodologias para cada estágio de produção, dos parafusos à gramatura das tintas e embalagens. “A exportação obriga a empresa a evoluir como um todo, a se profissionalizar, a inovar. Isso acaba se refletindo inclusive no mercado interno”, diz o executivo.
BRILHOLAC - Primeiro passo para ser global
Equipe brindou o primeiro embarque para o Uruguai ao lado do caminhão que levou o carregamento - Foto: Divulgação
Em 1989, ao escolher um nome para sua recém-fundada fábrica de produtos de limpeza em Tubarão, o empresário Aroldo Pereira optou por um com “cara” de multinacional. Mas levariam 30 anos para que a Globo do Brasil, indústria que fabrica cerca de 160 produtos de limpeza, despachasse o primeiro caminhão para além das fronteiras do País. Administrada desde 2006 pela filha de Aroldo, Maria Salete Meneses Pereira, a empresa sempre focou no mercado catarinense, além de somar uma pequena carteira de clientes no Paraná e no Rio Grande do Sul. A primeira exportação aconteceu em 2019, quando um distribuidor no Uruguai conheceu a marca.
“Nossa grande variedade de itens atraiu esse cliente. Somos uma empresa regional, mas com uma produção bastante complexa”, explica Maria Salete. Além de uma linha completa de produtos para limpeza automotiva, da fábrica também saem alvejantes e amaciantes de roupas, desinfetantes, lustra-móveis e outros itens, rotulados com a marca Brilholac – carro-chefe – ou outros sete nomes fantasia.
Por meio do INTERCOMP, a empresa realizou a Avaliação de Maturidade e começou a transição. “Foi muito importante para nos dar uma primeira visão de como seria o negócio, que parecia um bicho de sete cabeças. Achávamos que não teríamos capacidade de lidar com todas as questões de câmbio, métodos de pagamento, autorizações e documentação”, relembra Maria Salete. “Interagir com outras empresas que estão começando a exportar nos deu ainda mais coragem para ir em frente”, completa.
Logo ela percebeu que, além de possível, exportar para o Uruguai seria muito mais rentável e eficiente do que tentar o mercado da Região Sudeste. No primeiro ano de trabalho com os uruguaios, as vendas corresponderam a 8% da produção. Em 2020, com a pandemia, as remessas foram reduzidas. Para 2021 e os anos seguintes, a meta é retomar o volume e entrar em outros países do continente, como Paraguai, Bolívia e Chile, além de avançar em importações de matérias-primas. A empresa, hoje com 40 funcionários, está investindo para quase dobrar de tamanho.
FORNARI - Depois da frustração, a preparação
Objetivo de Luciane Fornari é chegar aos EUA e Europa e fazer exportações renderem metade do faturamento - Foto: Divulgação
Luciane Fornari trabalhava como secretária da oficina mecânica de caminhões da família do marido, em Concórdia, quando um produtor de ovos levou seu veículo para o conserto. “Estávamos vivendo o surto de gripe aviária, e ele questionou se conseguiríamos desenvolver um sistema para desinfetar os caminhões, o que era uma exigência da União Europeia”, recorda. Com a ajuda do marido e de um encanador, o produto foi desenvolvido com sucesso, e Luciane logo percebeu seu poder de escala. Era a origem da Fornari Indústria, especializada em limpeza e sanitização para o setor pecuarista.
Aos poucos o portfólio foi crescendo, incluindo lavadoras de ovos, cabines de higienização e mesas de ovoscopia, e a empresa se tornou um case de sucesso, com alguns prêmios de inovação e sustentabilidade no currículo. A internacionalização parecia um caminho natural, mas a primeira experiência demonstrou que a trajetória pode ser tortuosa. Em 2014, após a venda de 50 equipamentos de tratamento de água para Gana, o comprador copiou o produto e começou a fabricá-lo na China, pois a patente era somente nacional.
Depois dessa frustração, a Fornari passou a contar com o serviço de uma empresa de Joinville para negociar no mercado externo, além de buscar capacitações junto à FIESC e Sebrae. As exportações para a América Latina correspondem hoje a 8% do faturamento anual de R$ 9 milhões, mas o objetivo é chegar aos Estados Unidos e União Europeia e fazer as vendas externas responderem por metade do faturamento.
Com o lançamento do INTERCOMP, Luciane viu a oportunidade de traçar com mais discernimento o processo de internacionalização. “Entendemos onde deveríamos focar, como obter parcerias, como negociar. A plataforma ajuda muito a nos direcionar aos mercados corretos. Fora que o cliente nacional acaba valorizando muito mais uma empresa que exporta bem, pois sabe que para isso é preciso ter competência e qualidade”, avalia a CEO da empresa.
MAXION - Encontro de interesses
Para empresa do Oeste catarinense, Paraguai, Chile e Bolívia estão mais próximos que Norte e Nordeste do Brasil - Foto: Divulgação
Ao completar duas décadas de fundação, a fabricante de baterias automotivas Bater Life/Maxion traçava planos cada vez mais concretos para se internacionalizar. Com presença no mercado nacional do Centro e o Sul do País, a empresa sediada em Pinhalzinho enxergava boas oportunidades em países como Paraguai, Chile e Bolívia, muito mais próximos geograficamente que o Norte e Nordeste do Brasil.
O gerente administrativo Regis Luiz Bach lembra que, quase na mesma época em que a Bater Life/Maxion conquistava o primeiro cliente internacional, na Bolívia, em 2019, surgiu um convite para participar de um evento em Chapecó onde a FIESC apresentaria o INTERCOMP. “Respondemos a um questionário de Avaliação de Maturidade via aplicativo e o resultado foi interessante. Percebemos que já tínhamos uma cultura desencadeada na empresa, colegas com experiência, ferramentas de gestão de alto nível”, conta o executivo.
Mesmo assim, Bach e seus colegas entenderam que ainda faltavam conhecimentos específicos para entrar com mais confiança nos mercados vizinhos, do câmbio à formação de preços, da realidade de cada país às exigências fiscais e aduaneiras. A partir de então começaram a participar de cursos e capacitações, além de utilizar os serviços de inteligência comercial do programa para analisar os mercados-alvo.
No ano passado a pandemia atrapalhou, mas a empresa encerrou o ano vendendo 5% da produção de 40 mil baterias por mês para os mercados paraguaio e boliviano. “Quando começamos, e-mails e telefonemas não funcionaram bem pois ninguém na empresa dominava o espanhol, e as vendas só deslancharam quando visitamos pessoalmente os clientes. Agora temos uma pessoa contratada especificamente para o mercado externo. Mas estamos engatinhando ainda”, avalia Bach.
Atualmente, a empresa avalia o mercado chileno e faz contatos iniciais para entrar no Uruguai. O plano para os próximos anos é que até 20% da produção seja destinada ao mercado externo.