Em um mundo onde as despesas militares têm crescido incessantemente, o papel de cada nação na arena internacional se reconfigura. Com o gasto militar mundial ultrapassando a marca dos US$ 2,3 trilhões em 2023, o Sistema Internacional enfrenta uma transformação significativa, refletindo uma nova ordem geopolítica onde múltiplas potências emergem como protagonistas em uma narrativa até então dominada pelos Estados Unidos.
O Sistema Internacional
De acordo com o Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz (SIPRI), o gasto militar mundial subiu pelo nono ano consecutivo, ultrapassando a marca de US$ 2,3 trilhões em 2023. Pela primeira vez desde 2009, o gasto militar aumentou em todas as cinco regiões geográficas do mundo subdivididas pelo SIPRI, mas especialmente na Europa, Ásia, Oceania e Oriente Médio. A crise de 2008 é um marco de uma mudança estrutural do Sistema Internacional que se deu pela substituição de um contexto em que os Estados Unidos eram capazes de arcar com os custos bélicos de governança do sistema, para outro em que, aparentemente, haverá maior participação de diversos países.
O gráfico 2 mostra o crescimento da participação de Rússia, China e EUA nos gastos totais em defesa mundiais. Claramente Rússia e China vêm aumentando suas participações em detrimento dos EUA. A belicosidade russa e a ascensão meteórica da China configuram-se como claros elementos de contraposição à antiga ordem, o que já tem sido suficiente para, paulatinamente, intensificar tensões, tendo como epicentro o pivot do Leste Asiático e o Oriente Médio, onde aliados como Japão, Coreia do Sul, Austrália e Israel colaboram para a contenção do poderio chinês, russo e iraniano.
O impacto do cenário externo para o Brasil
Se por um lado, tal contexto traz um panorama geopolítico mais volátil (SIPRI, 2024), com especial impacto a países em desenvolvimento, como o Brasil, por outro, abre oportunidades produtivas e tecnológicas ligadas ao setor de defesa para o curto, médio e longo prazo. Em outras palavras, ainda que países em desenvolvimento possam sofrer com fugas de capitais, com restrições a exportações e outros eventos típicos de um momento conflitivo, o setor de defesa tende a ser um porto seguro aos investimentos, especialmente as empresas dispostas a se capacitar tecnologicamente.
No Brasil, a atual política industrial, denominada Nova Indústria Brasil (NIB), reconhece essas possibilidades ao definir uma missão específica voltada ao segmento de defesa, “Tecnologias de interesse para a soberania nacional”, cuja meta aspiracional é a de “Obter autonomia na produção de 50% das tecnologias críticas para defesa até 2033”. Essa aposta é ao mesmo tempo desafiadora e promissora, tal como outras enquanto o Brasil foi capaz de projetar, desenvolver e revelar competitividade, à exemplo do avião cargueiro KC-390 cujas exportações são realizadas para diversos países. O projeto emergiu de um diagnóstico de uma demanda potencial e a Embraer propôs o projeto para o governo. Com o apoio inicial da FAB, o KC-390 atingiu escala e sucesso.
A realidade do aumento dos gastos militares globais e a reconfiguração das potências internacionais apresentam tanto desafios quanto oportunidades. Para países em desenvolvimento como o Brasil, a situação atual oferece um terreno fértil para o avanço tecnológico e produtivo no setor de defesa. Apostar na inovação e no fortalecimento da capacidade defensiva nacional não apenas fortalece a posição do Brasil no palco internacional, mas também contribui para a sua soberania e estabilidade econômica em tempos de incerteza.