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É preciso limpar o terreno

Estado tem baixa cobertura de tratamento de esgoto e precisa andar rápido – e investir alto – para cumprir as metas de universalização.

Foto: Shutterstock

O novo Marco Legal do Saneamento, aprovado em 2020, movimentou uma das áreas mais estagnadas da infraestrutura brasileira. A lei definiu metas ousadas para todos os municípios do País, a universalização do saneamento básico até 2033. Isso significa garantir o abastecimento de água potável para 99% da população, e coleta e tratamento de esgoto para 90%. A meta é desafiadora, porém civilizadora, considerando que 33 milhões de brasileiros não têm acesso à água e 100 milhões ainda sofrem com ausência de coleta e tratamento de esgoto. A cobertura de esgoto no Brasil se estende a pouco mais de metade da população, enquanto 84% já têm acesso à água, de acordo com dados compilados pelo Instituto Trata Brasil.

Santa Catarina terá que andar rápido. Apenas 32,2% do esgoto urbano gerado no Estado é tratado adequadamente, em redes públicas, conforme compilação da FIESC com base nos dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) 2021. Nas cidades catarinenses que estão entre as 100 mais populosas do Brasil a situação é um pouco melhor, mas ainda assim elas ocupam a parte de baixo da tabela no ranking elaborado pelo Trata Brasil e GO Associados, que considera, além de cobertura, variáveis como perdas no sistema e investimentos.

Florianópolis, a catarinense mais bem colocada, ficou na 59ª posição no ranking de 2023. Blumenau ocupa a 68ª posição, e Joinville a 74ª. Nestas cidades os índices de tratamento de esgoto são respectivamente de 65,7%, 46,1% e 39,8%, segundo o estudo. A própria prefeitura de Florianópolis, entretanto, contabiliza que apenas 58% do esgoto gerado é tratado, percentual que vai aumentar com a entrada em operação de estações de tratamento ainda neste ano e no ano que vem. Na região sul da Ilha, porém, onde se encontram bairros como Ribeirão da Ilha, Pântano do Sul e Campeche, não há tratamento em rede pública, apenas por meio de fossas e sumidouros individuais.

Outras cidades de Santa Catarina, como Criciúma, Itajaí, São José e Palhoça, não chegam a tratar metade do esgoto, de acordo com os últimos dados disponíveis. Por outro lado, Balneário Camboriú e Jaraguá do Sul já atingiram as metas de universalização (leia o box). Na média, para a universalização dos serviços no Brasil é necessário um investimento de R$ 200 por habitante ao ano até 2033. “Porém, o investimento em Santa Catarina foi de apenas R$ 84 por habitante em 2021”, afirma Luana Siewert Pretto, CEO do Instituto Trata Brasil. “Por tudo o que representa, Santa Catarina deveria estar muito à frente em coleta e tratamento de esgoto.”

As metas impostas pelo novo Marco Legal vieram acompanhadas de uma série de mudanças para destravar o setor e torná-las exequíveis. Elas facilitam a criação de Parcerias Público-Privadas (PPPs) para a prestação de serviços, por exemplo. Também estimulam a concorrência vedando a prorrogação de contratos com empresas estatais sem licitação, ao mesmo tempo que garantem maior segurança jurídica para a privatização de empresas públicas.

Mesmo com alguns retrocessos regulatórios desde então, o mercado deu uma chacoalhada. Foram captados R$ 68 bilhões nas concessões já licitadas, sem contar as dezenas de projetos em estruturação pelo BNDES. A Corsan, companhia de saneamento do Rio Grande do Sul, estado que está longe de atingir as metas para o esgoto, foi privatizada neste ano. Já o Governo de São Paulo tenta privatizar a Sabesp, a despeito de o conjunto do estado já contar com 95% do esgoto urbano tratado. No Paraná, a Sanepar se mantém como estatal e firma PPPs para aumentar a cobertura onde é concessionária. No Rio de Janeiro o abastecimento de água é feito por uma estatal, enquanto o esgoto cabe a uma empresa privada. Em Joinville, onde a concessionária é uma empresa municipal, o próprio município busca recursos no exterior para financiar a universalização, ao mesmo tempo que formata PPPs para uma parte da cidade.

Concessões viabilizadas por novo Marco Legal captaram R$ 68 bilhões no Brasil - Foto: Shutterstock

“Não há uma solução única para os problemas de Santa Catarina; para cada situação deverão ser encontradas maneiras de viabilizar a universalização dos serviços”, defende Egídio Martorano, da FIESC. “É preciso incentivar as concessões privadas e as PPPs, além da abertura de linhas de crédito”, diz. O fato é que as regras do jogo mudaram, e os municípios têm que dar um jeito de cumprir sua obrigação. Com a diferença de que agora estão mais empoderados para, por exemplo, não renovar ou até mesmo romper contratos. Em Santa Catarina a companhia estadual Casan, que atua em 194 municípios onde a cobertura média de esgoto é inferior a 30%, passou a ter questionada sua capacidade de entregar as metas. Florianópolis, principal cliente da empresa, iniciou em outubro processo para retirar a Casan e contratar nova empresa de saneamento para atuação na região sul da Ilha.

Deficitário | O contrato de Florianópolis com a Casan foi assinado em 2012. Ele prevê a universalização dos serviços até 2032 e o cumprimento de etapas ao longo do tempo, contemplando investimentos e crescente cobertura de serviços, o que de acordo com a prefeitura não ocorre como deveria – uma auditoria está sendo realizada juntamente com a agência reguladora para que sejam detalhados os números. A essa altura do contrato, a cobertura de coleta e tratamento de esgoto deveria estar em 77%, segundo a prefeitura, mas ainda está longe de acontecer.

Com tratamento insuficiente, Florianópolis tem vários pontos sem balneabilidade - Foto: Eduardo Valente / SECOM

“O município de Florianópolis quer o investimento que merece, inclusive o que está deficitário, o que ficou para trás”, afirma Bruno Vieira Luiz, superintendente de Saneamento Básico da Secretaria Municipal do Meio Ambiente. Porém, além das limitações da concessionária, ele cita outros entraves para que as obras saiam do papel, como a dificuldade para a concessão de licenças ambientais – mesmo que as obras sejam justamente em favor do meio ambiente.

Com a capacidade contestada por diversos municípios e insatisfação da população, a Casan busca se reformular. O executivo Edson Moritz assumiu a presidência da estatal em agosto. Admitindo publicamente que a empresa não goza de boa imagem, promete mudanças culturais, melhoria da eficiência e redução de custos. Desde então a Casan enfrentou situações adversas, como o rompimento de um reservatório de água em Florianópolis, que gerou pânico, prejuízos e pesadas indenizações.

A empresa reconhece dificuldades para cumprir as metas nos municípios onde atua, pois o nível de atendimento atual é baixo e o prazo para universalização é curto, o que demanda investimento elevado em pouco tempo. Uma das estratégias é levantar recursos por meio de financiamentos públicos e privados e lançar papéis no mercado financeiro. Em outra frente, a empresa se articula para viabilizar PPPs e contratos de locação de ativos.

Estrutura no interior e obras na capital: Casan busca melhores indicadores - Fotos: Júlio Cavalheiro/SECOM (esq.); Arquivo CASAN (dir.).

Abrangência com eficiência

O Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto (Samae) de Jaraguá do Sul atende 99,8% da população com distribuição de água. A rede soma 946 quilômetros e chega a 74 mil unidades consumidoras. O abastecimento envolve 39 reservatórios e 72 unidades de pressurização, chamadas de boosters, que asseguram a chegada da água a localidades mais altas ou afastadas. Todas as ligações do município possuem hidrômetros, garantia de registro confiável do volume consumido em cada cliente.

Um dos focos vem sendo a redução das perdas de água. Entre as ações estão a execução rápida e qualificada dos reparos dos vazamentos, substituição e melhoria da infraestrutura, troca periódica dos hidrômetros, controle da pressão e pesquisa ativa de vazamento não-visível, com base na análise dos dados da telemetria. Desde o início do programa de controle de perdas, em 2011, o índice caiu de 41% para os atuais 31%.

O Samae se destaca por ser uma das poucas autarquias do País que atende as quatro vertentes do saneamento básico (água, esgoto sanitário, drenagem pluvial e resíduos sólidos). No sistema de esgotamento sanitário são mais de 660 quilômetros de redes coletoras e 137 unidades de bombeamento que direcionam os resíduos para quatro estações de tratamento. A fase líquida é devolvida aos rios e a sólida é prensada e encaminhada ao aterro industrial. Jaraguá do Sul possui 90% de coleta e tratamento de esgoto sanitário na área urbana.

“Nosso sistema de abastecimento de água está preparado para os próximos 30 anos”, informa o diretor-presidente Onésimo Sell. “Já o sistema de tratamento de esgoto, mesmo já atendendo o novo Marco Legal, passará por investimentos que levarão a melhorias e ampliações nos próximos anos”, anuncia.

Foto: Divulgação

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