A região de Joinville, um dos principais polos industriais do Brasil em setores como o metalmecânico, têxtil e de automação, está se tornando referência também no desenvolvimento e fabricação de componentes de grande porte para exploração e produção de petróleo e gás natural – o que coloca Santa Catarina no mapa do setor, mesmo sem haver produção relevante de petróleo ou gás natural no Estado.
Uma parceria entre o SENAI e a Petrobras viabilizou a instalação de três centros tecnológicos voltados para solucionar desafios do setor de óleo e gás com ênfase em robótica, manutenção aditiva a laser e na produção de equipamentos críticos, tais como conectores para dutos que ligam a tubulação de poços do pré-sal com plataformas e navios. As iniciativas são vinculadas aos Institutos SENAI de Inovação em Sistemas de Manufatura e em Processamento a Laser, sediados em Joinville, e receberão investimentos estimados em R$ 380 milhões nos próximos três anos.
Consórcio | O Centro Tecnológico de Equipamentos Mecânicos para Operações de Óleo e Gás (Cetemo) receberá aportes de R$ 283 milhões. Ele é o resultado de uma chamada pública lançada em 2023 pela Petrobras em nome do Consórcio Libra – em que a estatal opera um grande campo de pré-sal em parceria com a Shell Brasil, a Total Energies, a CNOOC Petroleum Brasil e a CNODC Brasil. O projeto apresentado pelo SENAI/SC foi selecionado nessa chamada. O desafio que a Petrobras propôs foi estabelecer no País um laboratório especializado no desenvolvimento e aperfeiçoamento de equipamentos mecânicos fundamentais na exploração de óleo e gás, que hoje são importados, além de ser capaz também de realizar testes para esses componentes.
“A Petrobras hoje compra componentes de fornecedores de países nórdicos e depende de uma cadeia produtiva que está toda no exterior. A ideia é criar capacidade no País para reduzir essa dependência”, explica Luís Gonzaga Trabasso, pesquisador-chefe dos Institutos SENAI baseados em Joinville. “Isso não é trivial, já que estamos falando, no caso de conectores de dutos de pré-sal, de peças de até 5 toneladas. Temos experiência com manufatura aditiva para o setor de óleo e gás, mas com peças bem menores.” O desenvolvimento desse tipo de expertise também poderá contribuir para promover melhorias nos componentes importados, adaptando-os a necessidades específicas da Petrobras.
A estrutura cria oportunidades para ampliar a competitividade nacional no setor de óleo e gás e também para estimular o crescimento da indústria metalmecânica de Santa Catarina. “Existe ao menos uma dezena de empresas de fundição na região de Joinville que poderão receber encomendas de peças e componentes de empresas do setor. O novo centro promoverá o desenvolvimento de uma cadeia nacional e regional de suprimentos”, afirma Gilberto Seleme, presidente da FIESC.
O Cetemo vai funcionar em uma instalação de mais de 3 mil metros quadrados e contará com uma infraestrutura avançada, com máquinas computadorizadas para torneamento e usinagem e equipamentos auxiliares como pontes rolantes e guindastes, impressoras 3D para fabricação de peças em aço, máquinas de solda, serras e cortadores.
Segundo o gerente de Tecnologias Aplicadas da Petrobras, Vinicius de França Machado, os resultados esperados são a pesquisa e desenvolvimento de novas soluções mecânicas, a construção e testagem de protótipos de novas tecnologias e a realização de engenharia reversa e análise de falha de equipamentos danificados em busca de melhorias. Também integram o escopo da iniciativa a capacitação e o treinamento de profissionais e pesquisadores na área para desenvolver a indústria nacional de manufatura e usinagem de equipamentos com as tecnologias de ponta do cenário mundial atual.
Outros R$ 100 milhões serão investidos nos Centros de Tecnologia Robótica e a Laser. “Os recursos vão dar um upgrade na estrutura já existente dos Institutos SENAI de Joinville”, explica Mauricio Cappra Pauletti, gerente executivo de Inovação e Tecnologia do SENAI/SC. “Estamos desenvolvendo novas competências para as equipes dos Institutos SENAI e ampliando a complexidade tecnológica de seu trabalho. Com isso, multiplicamos nossa capacidade de fazer parcerias com indústrias de Santa Catarina e do Brasil e responder às suas demandas.”
Playground de robôs | No caso do centro de Robótica, já foi concluído o projeto executivo para a construção de uma edificação de 3 mil metros quadrados para ampliar sua capacidade de testar equipamentos e tecnologias. O Instituto SENAI de Joinville desenvolveu, por exemplo, robôs para uso submarino em plataformas de petróleo e robôs capazes de escalar torres de flare, estruturas para queimar gases e vapores excessivos de forma controlada e segura. “Fazemos os testes operacionais dos robôs em nossas dependências, mas, quando eles precisavam ser avaliados em ambientes relevantes, não tínhamos estrutura adequada e os levávamos para locais que simulavam condições reais de operação”, conta Trabasso.
“Com os investimentos no centro teremos, por exemplo, uma estrutura capaz de mimetizar o flare e um tanque para testes representativos do ambiente submarino. Vamos construir uma espécie de playground de robôs, em que eles poderão ser testados antes de serem levados a um ambiente operacional.” O investimento no Centro de Tecnologias Laser, por sua vez, será canalizado para a aquisição de novas máquinas.
De acordo com Trabasso, a competência acumulada poderá contribuir para um processo de reshoring – que é a repatriação para o Brasil da produção de bens e serviços que foram transferidos para outros países. A infraestrutura criada para os centros poderá ser útil para outros segmentos, como o automotivo, o aeroespacial e o naval. As mesmas máquinas poderão ser usadas, por exemplo, para projetar e fabricar moldes, matrizes e ferramentas para o setor automotivo. “Nossas ferramentarias já foram referência, mas a atividade foi transferida para a China”, diz Trabasso.
Entre os possíveis clientes dos novos centros também figura a indústria naval catarinense, cujo polo fica em Itajaí, onde estão sendo construídas quatro fragatas para a Marinha do Brasil. “Os centros tecnológicos que estamos estruturando são plataformas estratégicas de inovação que fortalecem a capacidade da indústria brasileira de desenvolver soluções de alto valor agregado e impulsionam a formação de talentos para setores como o automotivo, aeroespacial, naval, energia e mineração”, afirma o diretor regional do SENAI/SC, Fabrízio Pereira.