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O modernizador de fábricas

Curso de Tornearia no SENAI foi o ponto de partida para que Claudimar Bortolin fundasse a Torfresma Industrial, fabricante de máquinas e equipamentos que também atua em automação e robótica - Por Maurício Oliveira

Claudimar Bortolin - Foto: Divulgação

Em 1992, aos 18 anos, Claudimar Bortolin enfrentou uma grande decepção: não foi chamado para servir no Exército, por excesso de contingente. Fazer carreira militar era o caminho que ele, caçula entre cinco irmãos, havia vislumbrado para deixar o trabalho na roça, rotina que cumpria desde pequeno ao lado da família na Linha Novo Horizonte, localidade a 15 quilômetros do centro da pequena cidade de Modelo, Oeste catarinense.

Logo ocorreria, no entanto, uma daquelas aplicações perfeitas para a frase “há males que vêm para o bem”. A mãe do rapaz, dona Vilma, ouviu no rádio que o SENAI estava convocando os jovens da cidade para participar de uma reunião. Sem saber direito do que se tratava, Claudimar pegou sua bicicleta e foi ao local no horário anunciado.

Ao chegar lá descobriu que a unidade do SENAI em São Miguel do Oeste, a 70 quilômetros, estava com seis vagas em seus cursos reservadas para jovens de Modelo, por conta de um convênio com a prefeitura – duas em Eletricidade, duas em Marcenaria e duas em Tornearia. Aquele encontro já era, na realidade, o teste de seleção.

“Decidi disputar uma das vagas em Tornearia pensando no futuro campo de trabalho”, descreve Claudimar. Ele lembrou que o pai, Lídio, tinha que ir às cidades vizinhas sempre que precisava de um simples parafuso ou de alguma outra peça, pois não encontrava quem pudesse fazer isso em Modelo.

No momento da prova Claudimar estava em suposta desvantagem, pois havia estudado até o 8º ano e enfrentaria concorrentes com o ensino secundário completo. Como a escola da Linha Novo Horizonte chegava apenas ao 4º ano e não havia opções de transporte até a região central de Modelo, ele permaneceu dos dez aos 15 anos longe dos estudos. Quando finalmente pôde cursar o 5º ano, era bem mais velho que a maioria dos colegas.

Mesmo com os anos de estudo a menos, Claudimar foi aprovado no teste, tornando-se um dos seis selecionados entre os 53 candidatos – número que ele guarda até hoje na memória, como um troféu. No dia 18 de fevereiro de 1992, terça-feira, uma caçamba da prefeitura de Modelo parou em frente ao sítio dos Bortolin com a missão de levá-lo para São Miguel do Oeste, junto com a respectiva mudança – cama, roupeiro, fogão, uma geladeira velha e algum estoque de comida, especialmente feijão e arroz.

As aulas começaram já no dia seguinte, com duração prevista de um ano e meio. Não era um curso fácil, tanto que os outros cinco rapazes de Modelo acabaram desistindo ao longo do caminho e voltaram à cidade natal. Claudimar seguiu firme, mesmo conciliando o curso com as aulas do ensino secundário e com uma série de trabalhos que começou a fazer nos finais de semana para conseguir algum dinheiro, como carpir terrenos e cortar grama. Para almoçar, ele fez um acordo com um restaurante: trabalharia como garçom entre 12h e 13h em troca de um prato de comida.

Foto: Divulgação

Presente | A habilidade que conquistou para servir espeto corrido abriu novas possibilidades de “bicos” aos finais de semana, em festas e eventos. Foi num casamento em que trabalhou como garçom que conheceu Janete, convidada do noivo. Eles logo começaram a namorar.

Quando concluiu o curso no SENAI, Claudimar ganhou um presente dos pais – um Escort Hobby azul, usado. Dois dias depois, o rapaz trocou o carro por um torno mecânico, ponto de partida para o projeto de abrir um negócio ali mesmo em São Miguel do Oeste, pois a cidade era bem maior que Modelo.

Como incentivo ao jovem tão esforçado, dois professores de Claudimar entraram como sócios, cada um deles com 25%. Assim nasceu, em julho de 1993, a Torfresma, nome composto pelas letras iniciais das três atividades às quais a empresa se dedicaria: tornearia, fresagem e manutenção.

Celebração em família: Claudimar e Janete vivem e trabalham juntos há 22 anos - Foto: Divulgação

Em 1999, quando Claudimar já havia comprado a parte dos sócios e se tornado proprietário de 100% da empresa, uma encomenda da Aurora abriu um novo horizonte para o negócio. Tratava-se do desenvolvimento de uma cadeira ergonômica para os trabalhadores da linha de desossa suína. O projeto foi bem-sucedido e inspirou a oferta de produtos semelhantes para outras agroindústrias, sempre com a possibilidade de adaptações às necessidades de cada cliente. “Nesse período a gente consolidou a vocação de desenvolver soluções customizadas para a indústria”, conta o empreendedor.

Nos sete anos entre a fundação da empresa e a consolidação da parceria com as agroindústrias da região Oeste catarinense, Claudimar respirou a Torfresma 24 horas por dia. E não se trata de força de expressão: seu escritório era também seu quarto. Durante todo esse tempo, ele continuou fazendo bicos como garçom e trocando o almoço pelo trabalho do meio-dia às 13h, naquele mesmo restaurante dos tempos de estudante.

Crescendo 17% ao ano em média nos últimos cinco anos, a Torfresma já projetou e instalou mais de mil linhas industriais, atendendo mais de 250 grandes industrias - Foto: Divulgação

Escala | Alguns acontecimentos na virada do milênio mudaram essa rotina. Além do crescimento dos negócios, os pais de Claudimar foram morar em São Miguel do Oeste e ele se casou com Janete, em 2000. Ela deixou de ser secretária do hospital em que trabalhava para integrar o time da Torfresma, que àquela altura já somava dez funcionários. Hoje, é a diretora financeira. “Somos um raro casal que não apenas vive junto, mas trabalha junto há 22 anos. Janete é o grande pilar da minha vida e da nossa família”, reconhece Claudimar. Em 2002 nasceu a primeira filha do casal, Shayanne, e em 2007 a caçula, Thávynni.

Quanto mais frequentava os clientes, mais Claudimar percebia oportunidades para construir ou aprimorar equipamentos. A escala das encomendas foi aumentando. Em 2008, a empresa participou da construção de um grande frigorífico da Sadia em Lucas do Rio Verde (MT). No ano seguinte, passou a atuar na linha de maquinários para a produção de hambúrgueres. Em 2010, também em resposta ao desafio apresentado por um cliente, a empresa desenvolveu seu primeiro robô, dedicado à tarefa de paletização.

A partir da primeira contratação de uma consultoria, em 2011, a Torfresma passou a pensar estrategicamente no mercado global. Avanços importantes nessa direção têm sido dados nos últimos anos, como a fundação da Torfresma USA, em 2020, sediada no estado de Delaware, e a abertura de um escritório no Chile, que em breve se transformará também em unidade industrial.

Torfresma

  • Fundação: 1993
  • Sede: São Miguel do Oeste
  • Colaboradores: 437
  • Presença Global: 12 países

Torno presenteado pelo SENAI

Prestes a completar 50 anos, Claudimar recebeu há poucos meses um presente inesquecível do SENAI: o torno em que ele começou sua trajetória – equipamento que, após muitos anos de serviços prestados, estava deixando de ser utilizado como ferramenta de ensino. Devidamente protegido por um domo de acrílico, a exemplo das peças mais valiosas dos museus, o torno foi colocado bem na entrada da fábrica da Torfresma, como inspiração permanente para toda a equipe.

Foto: Divulgação

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