Döhler realiza transição da gestão familiar para um modelo de governança que prevê a contratação de executivos do mercado e a presença de familiares no Conselho e comitês da companhia - Foto: Divulgação
Udo Döhler chegou a iniciar uma promissora carreira como advogado, mas o legado familiar falou mais alto e ele passou a se dedicar exclusivamente à empresa fundada pelo bisavô. Hoje, mais de meio século depois dessa decisão, a Döhler é uma das maiores empresas brasileiras dos setores de cama, mesa, banho e decoração, com faturamento anual próximo a R$ 1 bilhão, produção mensal de 1,4 mil toneladas de tecidos e um portfólio de 12 mil itens. “Quando percebi que havia um grande futuro para a companhia, com muitas oportunidades de crescimento, passei a me dedicar de corpo e alma à missão, ao lado de uma aguerrida equipe formada por familiares e outros profissionais”, lembra ele, aos 81 anos.
Os indicadores da expansão da Döhler desde então são impressionantes. A empresa saiu do centro de Joinville e se transferiu para o distrito industrial, área em que dispõe atualmente de 225 mil metros quadrados construídos no total de 1,2 milhão de metros quadrados – 300 vezes maior que a instalação original. Os 200 funcionários do final da década de 1960 se transformaram em mais de 3 mil.
Hoje, como presidente do Conselho de Administração, Udo continua muito ativo – inclusive mantém o hábito de chegar à empresa às 6h30min. “É um jeito de iniciar o dia com calma e planejamento, porque as demandas começam a aparecer das 8h em diante”, explica. Sua meta central na atual fase é consolidar a transição da gestão familiar para um modelo de governança que prevê a contratação de executivos do mercado e a presença de familiares no Conselho e comitês da companhia.
“Optamos por esse caminho há dez anos, a partir de um acordo de acionistas, e estamos avançando para completar o processo”, descreve. O plano da Döhler é ingressar na B3 e dobrar de tamanho em um horizonte de até dez anos. “Faço meus exercícios e cuido da minha dieta porque quero ver essa trajetória acontecer dentro da brevidade possível.”
Estamparia digital: objetivo é dobrar de tamanho em 10 anos - Foto: Divulgação
Uma das empresas mais antigas de Santa Catarina, a Döhler foi criada em 1881, em Joinville, pelo imigrante alemão Carl Gottlieb Döhler, ainda nos primórdios da colonização alemã da região, iniciada em 1851. Desde então superou diversos períodos difíceis, como a atual concorrência predatória de marcas estrangeiras. “A Döhler sempre seguiu adiante porque nunca se acomodou e permaneceu investindo em qualidade e inovação. Este é o segredo para encontrar novos caminhos”, afirma Udo.
A trajetória da companhia inclui feitos como o desenvolvimento de um tecido invisível à luz infravermelha, fornecido às Forças Armadas. O empresário ressalta, no entanto, que inovar passa também pela exploração de novos mercados e nichos, a exemplo do foco que vem sendo dado aos setores hoteleiro, hospitalar e de enxovais corporativos. Outra diretriz é a readaptação constante da estratégia – depois de chegar a ter mais da metade da produção destinada às exportações, por exemplo, a empresa voltou a priorizar o mercado interno, responsável por 90% das vendas atuais.
Referência no pilar ambiental, a Döhler foi a primeira empresa de Joinville e a terceira de Santa Catarina a conquistar a certificação ISO 14001. Mantém 425 mil metros quadrados de reserva arborizada, mais de 2,3 mil painéis fotovoltaicos instalados em sua fábrica – um dos maiores parques de energia solar em Santa Catarina – e reaproveita 40% da água utilizada na produção. Vários lançamentos têm a marca da sustentabilidade, como a cortina Renove, produzida a partir de fios de garrafas PET retiradas da natureza.
Nascido em Joinville em 1942, Udo é o terceiro filho entre quatro irmãos – três rapazes e uma moça. Começou a trabalhar aos 14 anos como office boy na empresa da família, e quando chegou a época de escolher uma profissão se decidiu pelo Direito, que estudou em Curitiba. Udo voltou à cidade natal depois de formado. Começou a advogar e a dar aulas, mas aos poucos se envolveu na gestão da empresa familiar, até o momento em que optou pela dedicação integral à Döhler.
Fábrica tem um dos maiores parques de energia solar de Santa Catarina - Foto: Divulgação
Luiz Henrique | Uma das marcas da trajetória de Udo é a atividade voluntária e associativista. Ele presidiu a Associação Empresarial de Joinville (ACIJ) em cinco períodos – o primeiro mandato ocorreu entre 1974 e 1976, e o mais recente entre 2011 e 2012. Comandou, também, a Federação das Associações Empresariais de Santa Catarina (Facisc) entre 1987 e 1989.
Nessa mesma época, a convite de um amigo de muitos anos, o ex-governador Luiz Henrique da Silveira (1940-2015), integrou o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, no período em que Luiz Henrique foi ministro da Ciência e Tecnologia do governo José Sarney. “Eu e o saudoso Luiz Henrique nos conhecemos como advogados, quando ele nem havia entrado na política. Estávamos em lados opostos numa determinada causa. Depois que a decisão saiu, favorável ao meu cliente, consolidamos uma grande amizade”, lembra Udo.
Foi por insistência de Luiz Henrique que o líder da Döhler aceitou um novo desafio, aos 70 anos: candidatar-se à prefeitura de Joinville. Eleito em 2013, teve a gestão aprovada pela população e foi reconduzido para um segundo mandato, concluído em 2020. “Foram oito anos de extremo crescimento como pessoa e como joinvilense, pois pude colocar em prática ações que o município reclamava em saúde, educação e saneamento, entre várias outras áreas”, avalia.
Udo Döhler foi também cônsul honorário da Alemanha em Joinville, esteve por muitos anos à frente do Corpo de Bombeiros Voluntários da cidade, integrou o Conselho de Política Industrial da FIESC e atuou como conselheiro da Confederação Nacional da Indústria (CNI), além de participar da Associação Brasileira da Indústria Têxtil. Presidiu o Instituto Joinville 150 Anos, na coordenação das comemorações do sesquicentenário, em 2001, e atuou como conselheiro do Desenville, Conselho de Desenvolvimento da cidade.
Dona Helena | Outro trabalho voluntário de grande destaque é na gestão do Hospital Dona Helena, que Udo assumiu a pedido da Associação Beneficente Evangélica, entidade mantenedora da instituição, após ter prestado suporte jurídico gratuito ainda no tempo em que trabalhava como advogado. As melhorias implementadas levaram o Dona Helena a se tornar o primeiro hospital brasileiro a ter a qualidade certificada em todos os serviços oferecidos. Em 2014 conquistou a certificação JCI (Joint Commission International), a mais importante do mundo na área hospitalar.
Entre os vários reconhecimentos que Udo recebeu ao longo da trajetória, um dos que ele mais se orgulha é a Ordem do Mérito Industrial, concedida pela Confederação Nacional da Indústria em 2003. Hoje, do alto de toda a experiência acumulada, ele consegue sintetizar a atuação de um líder em apenas três verbos: criar, compreender e negociar. “Quem age simultaneamente nestas três frentes consegue alcançar o sucesso.” Sua expectativa para os próximos anos é positiva. “O Brasil tem tudo para continuar crescendo e a Döhler vai acompanhar esse movimento.”