Do nascimento em uma comunidade remota à presidência da Cooperativa Central Aurora Alimentos (Aurora Coop), terceiro maior conglomerado agroindustrial brasileiro de proteína animal. Esta é a síntese da trajetória de 70 anos que Neivor Canton completará em agosto – uma caminhada que, como toda boa história de superação e conquistas, avançou passo a passo impulsionada pelo desejo de realização e por muito trabalho.
Tudo começou em Ipumirim, hoje município com 8 mil habitantes, mas ainda pertencente a Concórdia naquele ano de 1954. Neivor nasceu como o oitavo filho de João e Ermida, casal de agricultores que chegara da região de Encantado (RS). A família ganharia ainda mais três filhos e contribuiria fortemente para o desenvolvimento do pequeno núcleo populacional. Como um dos mais jovens, Neivor dispôs de mais oportunidades para se dedicar aos estudos, embora tenha sempre ajudado na roça e na criação de animais ao longo da infância e da adolescência.
A atuação como coroinha o levou a se tornar “comentarista de missa”. “Naquele momento em que as missas deixavam de ser rezadas em latim, tornou-se comum ter alguém no púlpito para explicar o significado das passagens”, ele descreve. A desenvoltura do rapaz chamou a atenção do dono de um escritório de contabilidade local, que estava à procura de um office-boy.
Foi assim que Neivor começou no primeiro emprego, aos 14 anos. O patrão era Odacir Zonta, que estava com apenas 23 anos e se tornaria conhecido pela carreira política. Enquanto fazia o curso técnico em contabilidade, Neivor teve as responsabilidades ampliadas e passou a se relacionar com os principais empresários locais. Essa rede de contatos o levou ao envolvimento com a política: tornou-se vice-prefeito e, depois, prefeito.
Neivor fez o curso de Letras em Palmas (PR) antes de se formar também em Direito pela Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), em Joaçaba, com especialização posterior em Direito Tributário e em Direito Administrativo. Exerceria a profissão por poucos anos, contudo.
Nesse meio tempo, o antigo chefe Odacir Zonta havia se transferido para Concórdia, tornando-se presidente da Cooperativa de Produção e Consumo Concórdia (Copérdia) em 1980, cargo para o qual seria sucessivamente reeleito. Em 1989, quando se elegeu prefeito de Concórdia, Zonta convidou o antigo companheiro para ajudá-lo na gestão da Copérdia.
Ao assumir a direção operacional, Neivor iniciou a relação com a Aurora, já que a Copérdia havia se associado pouco antes à cooperativa central, fornecendo suínos, ração e leite. À medida que Zonta evoluía na carreira política – tornou-se deputado estadual e, mais tarde, deputado federal –, Neivor consolidou-se como o nome natural para sucedê-lo à frente da Copérdia. Já havia se tornado vice-presidente e assumiu o comando em 1995, permanecendo no cargo até 2007.
Reconhecido como administrador competente, preocupado em conciliar as funções sociais das cooperativas com a viabilidade financeira, Neivor foi convidado a integrar a chapa que se tornaria vencedora das eleições na Aurora. A presidência ficou a cargo de Mário Lanznaster, parceiro histórico de Aury Bodanese, fundador da cooperativa central em 1969.
Parceria | Foi apenas ao iniciar o trabalho na Aurora, em 2007, quando já estava com 52 anos, que Neivor deixou de morar em Ipumirim e se mudou para Chapecó. Os três filhos do casamento com Rosane, que conhecera muitos anos antes na cidade natal, também vivem na maior cidade do Oeste catarinense: as médicas Cândida e Joseane e o advogado Neivor Augusto. O único neto, por enquanto, é Caetano, cinco anos, filho de Joseane.
Lanznaster e Neivor desenvolveram uma forte parceria à frente da gestão da Aurora. “Ele era um líder visionário, com quem tive a sorte de compartilhar a sala por muitos anos”, conta Neivor. Com a morte de Lanznaster em outubro de 2020, aos 80 anos, após um longo embate contra um tumor no fígado que não o afastou do trabalho, a presidência da Aurora passou às mãos daquele que era considerado o seu sucessor natural. “Nem podemos chamar de transição, porque foi uma continuidade sem turbulências”, considera o atual presidente da Aurora Coop.
À frente do cargo, Neivor consolidou-se como ícone do modelo que ele chama de “cooperativismo de resultados”, que não pode ser confundido com assistencialismo. “Olhando para a realidade brasileira, o cooperativismo tem um papel importante a cumprir como agente do desenvolvimento social e econômico. Para isso é essencial que seja produtivo e impulsione o crescimento de cada um dos associados.”
A Aurora tem cumprido à risca essa missão ao longo dos anos. Terceira maior produtora brasileira de proteína animal, a empresa agrega valor à produção de milhares de produtores rurais, que se inserem em uma cadeia produtiva de alta tecnologia e alcance global. Somente no ano passado, quando a companhia faturou cerca de R$ 22 bilhões, foram criados quase 4 mil novos postos de trabalho. Em abril de 2024 a Aurora Coop inaugurou em Chapecó uma nova indústria de processamento de carne.
Além de comandar o enorme empreendimento, Neivor é um porta-voz relevante dos anseios da região Oeste de Santa Catarina e do agronegócio no Estado. Um dos temas sobre os quais tem se pronunciado com mais ênfase é a necessidade de aprimorar a infraestrutura. “Temos que impulsionar o modal ferroviário. O transporte por rodovias está se tornando cada vez mais inviável e oneroso para assegurar o fornecimento de grãos à agroindústria catarinense”, descreve. “A iniciativa privada pode fazer investimentos em ferrovias, desde que o poder público delibere nesse sentido e reduza os entraves burocráticos.”
Atuar como liderança tornou-se natural na carreira de Neivor, que ocupou vários cargos representativos. Presidiu a Federação das Cooperativas Agropecuárias de Santa Catarina (Fecoagro) e a Organização das Cooperativas do Estado de Santa Catarina (Ocesc). Quando prefeito, comandou a Federação Catarinense de Municípios (Fecam) e a Associação dos Municípios do Alto Uruguai Catarinense (Amauc).
Olhando com otimismo para o futuro da Aurora, ele revela que o plano estratégico é triplicar de tamanho nos próximos dez anos, como resultado de um robusto programa de investimentos em várias frentes – incluindo a construção de novas fábricas e a ampliação e modernização das existentes. A tecnologia certamente será uma aliada dessa expansão, mas há certos aspectos que Neivor faz questão de manter exatamente como são. Um exemplo são as assembleias gerais realizadas a cada mês com a presença dos presidentes e dos principais dirigentes das cooperativas filiadas. “Não se pode abrir mão da riqueza que essas ocasiões proporcionam para um gestor”, afirma.
- Receita operacional bruta de R$ 21,7 bilhões em 2023
- Investimentos de R$ 939,1 milhões no ano
- 44,8 mil funcionários
- 14 cooperativas filiadas, com 85,6 mil famílias associadas
- 1,3 milhão de aves, 32 mil suínos e 1,6 milhão de litros de leite processados por dia
- Mix de 850 produtos
- Exportações para 80 países, origem de 34,5% das receitas