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Não é novidade que o custo do dinheiro é um dos fardos mais pesados que os empreendedores brasileiros têm que carregar ao longo de sua jornada. A situação que é histórica tornou-se ainda mais aguda com a alta da taxa básica de juros da economia, a Selic, determinada pelo Banco Central. No curto período de um ano e meio os juros básicos saltaram de 2% para 13,75% ao ano com o objetivo de conter a alta inflacionária, no que se configura no mais longo ciclo de alta da história e o maior choque de juros em 23 anos.
É uma medida amarga porque força a freada da atividade retirando o oxigênio das empresas, seja no financiamento das operações do dia a dia ou das intenções de crescimento de mais longo prazo. A pesquisa Sondagem Industrial divulgada em julho pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) revelou que a preocupação dos empresários com os juros é a maior desde 2016. “Desde dezembro a taxa real se encontra em patamar que inibe a atividade econômica”, afirma o gerente de Análise Econômica da CNI, Marcelo Azevedo.
A manutenção da Selic em 13,75% ao ano em setembro – mesmo valor de agosto – sinaliza para o final do ciclo de alta, mas não significa que a taxa retornará logo aos patamares relativamente baixos do início de 2021. Por conta disso a taxa DI para 2028, que indica a projeção do mercado para o custo real do crédito para as empresas, era negociada a mais de 12% no final de setembro. Isso quer dizer que o mercado trabalha com o cenário de ao menos sete anos com juros acima de dois dígitos ao ano.
O prolongamento do cenário preocupa até empresas bem estruturadas do ponto de vista financeiro, que possuem fôlego – baixo endividamento e caixa robusto – para atravessar períodos difíceis, mas que podem se apertar no longo prazo. O custo de captação por meio de emissão de debêntures, por exemplo, multiplicou-se por três desde o ano passado, mesmo para as empresas da elite do crédito, com rating AA.
Diante disso, médias e grandes empresas botaram o pé no freio em 2022, reduzindo substancialmente a tomada de empréstimos, de acordo com o Indicador de Demanda das Empresas por Crédito da Serasa Experian. Já as micro e pequenas não puderam exercer essa opção. Em geral menos estruturadas que suas congêneres de maior porte, elas precisam de dinheiro na mão para honrar dívidas de curto prazo e pagar fornecedores ou salários, tendo que recorrer constantemente ao crédito que, de tão caro, pode ao invés de resolver o problema machucar feio ou até matar.
Uma boa notícia para quem está nessa situação é a proliferação das fintechs, as startups do setor financeiro que entram com cada vez mais força no mercado de crédito. Utilizando tecnologias avançadas para realizar, por exemplo, análises de crédito, elas estão tornando tudo muito mais simples, rápido e mais barato na comparação com empréstimos bancários tradicionais.
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18,9%
Taxa de juros anual média para crédito a PJ
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4,5 pontos percentuais
Crescimento em relação ao ano passado
Obs: Em agosto. Fonte: Febraban/BC
Marketplace | A Associação Brasileira de Crédito Digital (ABCD) estima que as empresas do setor já são donas de cerca de 5% do mercado de crédito no Brasil. Sandro Reiss, o presidente da instituição, projeta que até o fim da década as fintechs deverão responder por 30% a 40% do mercado nacional de crédito.
Pesquisa realizada pela ABCD aponta que as fintechs voltadas a pessoas jurídicas tiveram crescimento médio de 430% em sua carteira de empréstimos em 2021, na comparação com 2020. Elas oferecem diversas modalidades, como financiamento de capital de giro, desconto de duplicatas e antecipação de recebíveis. Dentro desse universo, um arranjo que se destaca é o marketplace de crédito, que conecta os tomadores a diversas instituições financeiras e investidores em um só ambiente digital.
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430%
Crescimento da oferta de crédito por fintechs em 2021
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5%
Participação das fintechs no mercado
Principais modalidades
- Financiamento de veículos
- Financiamento de capital de giro
- Crédito geral (com e sem garantias)
- Desconto de duplicatas
- Antecipação de recebíveis
- Antecipação de contatos futuros
Fonte: ABCD
Foi nesse contexto de necessidade das empresas e de novas possibilidades tecnológicas que a FIESC criou, no primeiro semestre deste ano, a plataforma FIESCMAIS, um marketplace voltado não somente à disponibilidade de crédito, mas também a serviços financeiros digitais. Nela é possível ter conta corrente, acesso a serviços como internet banking, TED e PIX, maquininha de cartão e, mais importante, acesso a crédito rápido e mais barato do que o oferecido pelo sistema financeiro tradicional.
Um dos modos de obtenção de crédito é com o uso da própria maquininha. A modalidade batizada de crédito fumaça permite a contratação de recursos para capital de giro no montante de até duas vezes o faturamento mensal obtido com pagamentos em cartão em uma padaria, por exemplo. Sequer é necessário ter a máquina de cartões da bandeira FIESCMAIS – pode ser de outra marca. Não é preciso enviar documentos. Basta se cadastrar na plataforma e tanto a aprovação quanto a análise de crédito são feitas digitalmente.
Em outra modalidade, o desconto de duplicatas, a análise para o limite de crédito é realizada em um tempo médio de 15 segundos. Após o envio das notas fiscais eletrônicas para o sistema, o crédito cai na conta em menos de 40 segundos. “Quanto mais operações forem realizadas na plataforma, menores vão ficando as taxas e maiores os limites de desconto”, diz Rodrigo Carioni, gerente-executivo do CIESC e coordenador do projeto FIESCMAIS.
O objetivo principal é auxiliar pequenas e médias indústrias que precisam de ajuda financeira. É a esta faixa, com faturamento de até R$ 10 milhões por ano, que são destinados novos serviços como a oferta de crédito de capital de giro, em valores que começam em R$ 500 e vão a R$ 300 mil, com juros a partir de 1,7% ao mês e até 24 meses para a quitação. O mais interessante é que se trata de um crédito sem garantia real – bastam notas promissórias ou o aval dos sócios. “O calcanhar de Aquiles das pequenas empresas é a garantia, e esse produto contorna o problema”, informa Carioni.
A expansão desses serviços se ancora em uma revolução tecnológica em curso no mercado financeiro, sintetizada pelos conceitos de open banking ou open finance. A principal característica do sistema é a capacidade de padronizar o compartilhamento de informações de clientes de forma segura entre diversas instituições financeiras. É por isso que serviços como análise de crédito por várias instituições ao mesmo tempo são praticamente instantâneos, e por meio do marketplace o cliente pode comparar preços e condições e escolher a opção mais vantajosa.
Uma recente experiência da área de crédito estimulou a Federação a investir na plataforma. Em 2020, no auge da pandemia, a FIESC firmou parceria com o BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul) para disponibilizar crédito de capital de giro de R$ 20 mil a R$ 50 mil para micro e pequenas indústrias. Com 18 meses de carência, prazos longos e sem a necessidade de garantias – apenas a indicação de uma empresa cliente ou sindicato da categoria –, o dinheiro salvou centenas de empresas, e a experiência foi o ponto de partida para a estruturação de um novo serviço.
Crédito fumaça: contratação de duas vezes o valor faturado na máquina de cartão - Foto: Shutterstock
Credibilidade | Com foco nas empresas industriais, a plataforma FIESCMAIS tem a credibilidade da Federação das Indústrias para atrair empresários do setor. A plataforma, por sua vez, tem como provedor o LogBank, empresa do Grupo Stefanini, que possui um leque gigantesco de parcerias e conexões com instituições financeiras – se apresenta como um hub de operações de crédito e financiamentos – que se tornaram acessíveis por meio da FIESCMAIS.
Isso não significa que a plataforma não possa desenvolver seus próprios serviços e parcerias. Uma linha de crédito do Badesc (Agência de Fomento de Santa Catarina) para investimento, com fundo de aval do Governo do Estado, está sendo disponibilizada na plataforma. Já indústrias que desejam financiar seus próprios clientes, por exemplo, podem estruturar sua própria fintech utilizando a plataforma FIESCMAIS. Bom para os clientes e também para as indústrias, que podem melhorar a rentabilidade de seus recursos ao mesmo tempo que oferecem facilidades aos clientes.
Enquanto algumas empresas já aproveitam as oportunidades, muitas ainda estão limitadas aos serviços das instituições tradicionais, ancoradas em relacionamentos de décadas com gerentes de bancos que talvez já não possam oferecer os melhores serviços disponíveis no mercado. Nesse sentido, a revolução digital do setor financeiro é uma ferramenta de competitividade da indústria e é preciso informar o setor – este é um dos objetivos da FIESC com a estruturação da plataforma.