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Parcerias para destravar o Estado

Após o primeiro projeto decolar em Jaguaruna, diversas parcerias público-privadas são avaliadas para tentar solucionar gargalos logísticos de Santa Catarina - Por Leo Laps.
Foto: Adobestock

No dia 28 de novembro de 2024, a pequena cidade de Jaguaruna foi protagonista de um fato inédito para Santa Catarina. Com direito a um leilão na B3, a Bolsa de Valores de São Paulo, o Governo do Estado bateu o martelo para a primeira parceria público-privada (PPP) da sua história com a concessão patrocinada do Aeroporto Humberto Ghizzo Bortoluzzi – inaugurado em 2014 no município de 20 mil habitantes, localizado no Sul do Estado – para o Consórcio Aeroportuário Regional Sul. Pelos próximos 30 anos, os vencedores poderão explorar comercialmente o local e receber aportes de cerca de R$ 2 milhões do Governo. Como contrapartida, terão de investir R$ 38 milhões em melhorias operacionais e de infraestrutura para aumentar o número de voos e passageiros – 133 mil pessoas embarcaram ou desembarcaram de aviões em Jaguaruna em 2023.

Aeroporto de Jaguaruna: contrato prevê exploração do entorno - Foto: Divulgação

O modelo de PPPs é uma das bandeiras levantadas pela FIESC na última década como alternativa viável para agilizar obras de infraestrutura no Estado. “Temos muito claro, pelos monitoramentos que fazemos, pelas condições, demandas e gargalos logísticos, que o Governo tem exaurido sua capacidade de investimentos. A PPP ou concessão é a única saída para a grande demanda logística que nós dispomos”, afirma Egídio Antônio Martorano, presidente da Câmara para Assuntos de Transporte e Logística da FIESC.

O Governo de Santa Catarina tem trabalhado para aplicar o modelo em uma série de estruturas já existentes e também em projetos a serem construídos do zero. Entre os próximos na fila estão a concessão administrativa do Complexo Prisional de Blumenau e o aprofundamento do calado da Baía da Babitonga, cuja obra deverá ser contratada pelo Porto de São Francisco do Sul e financiada pelo Porto Itapoá, que será ressarcido ao longo de 12 anos por intermédio da receita das tarifas portuárias. Trata-se de uma obra emergencial estratégica para a competitividade do porto e de Santa Catarina, que viabilizará o atendimento dos navios de maior porte que vão operar na costa brasileira. “Não se tinha perspectiva para esta obra em função da falta de recursos”, afirma Martorano. “Precisamos de solução similar para o Complexo Portuário de Itajaí.”

Há uma série de outras possibilidades sendo estudadas pelo Estado, entre escolas, parques ecológicos, unidades de saúde e obras de mobilidade. Uma das mais desafiadoras é a construção da Via Mar, rodovia paralela à BR-101 Norte que tem custo de execução calculado na casa dos R$ 9 bilhões. O Plano Estadual de Logística de Transporte (PELT), contratado pelo Governo, deverá fornecer indicações do potencial para participação do setor privado na construção de corredores logísticos e obras estruturantes em todos os modais. Na Agenda para Infraestrutura da FIESC são sugeridas PPPs para manutenção preventiva e rotineira das rodovias, o que é considerado o maior desafio da malha rodoviária catarinense.

Leilão do aeroporto na B3, em novembro: primeira PPP da história de SC - Foto: Eduardo Valente/SECOM

Especiais | Regidas por lei criada em 2004, as PPPs têm características que as diferenciam de outros tipos de contratos públicos – por isso são chamadas de concessões especiais. Nas concessões comuns, as empresas obtêm receita da cobrança direta de tarifa dos usuários. É o que acontece com os serviços de transporte público, energia elétrica e rodovias. Nas PPPs a remuneração das empresas pode vir de aluguéis, espaços publicitários, tarifas, além de pagamentos do Governo ou uma combinação de ambos. No caso das concessões patrocinadas – como a do Aeroporto de Jaguaruna –, há uma complementação de receitas pelo setor público. As concessões costumam ter entre cinco e 35 anos de duração, e os riscos (financeiros, de construção, operacionais) são compartilhados entre os setores público e privado.

Entre as vantagens estão a melhoria dos serviços públicos, com aumento da eficiência e desempenho característicos do setor privado, além de maiores possibilidades de inovação e aplicação de novas tecnologias. A máquina pública fica mais enxuta, com menos contratos e licitações. Além disso, o setor privado tem na essência a criação de soluções mercadológicas mais eficazes e dinâmicas, algo que o setor público, de praxe, não costuma buscar.

“Em Jaguaruna o consórcio vislumbrou a oportunidade de novos negócios. Poderão explorar não só o aeroporto, mas o entorno, construindo e arrendando espaços. Antes, com o Governo administrando, não havia o viés de desenvolver atividades econômicas lá. Não é função do Estado, por exemplo, construir prédios para alugar”, explica Renato Dias Marques de Lacerda, diretor-presidente da SCPar Invest SC, a empresa do Governo do Estado responsável por gerar investimentos em território catarinense.

Alternativa | A SCPar Invest SC administra os projetos e processos para criação de novas propostas de PPPs e concessões comuns. “A PPP deve ser considerada no processo decisório de contratação de uma obra pública. Não necessariamente será a melhor opção, mas precisa ser avaliada como alternativa em todas as situações”, explica Lacerda.

Ao optar por uma PPP, o Estado não apenas evita desembolsos imediatos como também transfere a responsabilidade da gestão e manutenção ao parceiro privado. Essa abordagem permite ao Estado centralizar esforços em um único contrato em vez de gerenciar várias licitações para diferentes serviços. Para Lacerda, o modelo pode resultar em obras de maior qualidade e durabilidade. “A empresa contratada é responsável pela manutenção, então vai querer fazer algo que não gere despesas, algo com qualidade”, avalia.

“As concessões demoram mais para sair do que as licitações tradicionais. Exigem estudos mais aprofundados e audiências públicas, modelagem econômica muito bem feita. Mas elas geram receita para as prefeituras através das outorgas, além de tirar os custos do município na manutenção das infraestruturas, e oferecem mais transparência e controle social”, enumera o advogado Rodrigo Jensen, que esteve à frente da Secretaria de Parcerias e Concessões de Blumenau (Separc) até outubro. “A iniciativa privada é mais inovadora e mais célere que a gestão pública. Isso é outra vantagem.”

Desde 2013 envolvido com a administração pública de Blumenau, Jensen presidiu, a partir de 2019, o Comitê de Implementação de PPPs em Blumenau, que dois anos depois ganhou corpo e se tornou a Separc. “Um corpo técnico qualificado, independente de implementadores externos, é essencial para executar uma modelagem econômica bem feita, algo importante demais em contratos longos, com até mais de 30 anos, que exigem eventuais reequilíbrios contratuais ao longo deles. Uma modelagem mal-executada afasta as empresas das propostas de PPPs”, argumenta o ex-secretário, que participou de diversos projetos de concessão e da provável primeira PPP do município, voltada para a modernização de toda a iluminação pública da cidade, cuja abertura de envelopes foi adiada em setembro do ano passado.

Saneamento | A exemplo de Blumenau, a prefeitura de Joinville também vem listando uma série de estruturas para concessões comuns ou especiais. Entre as possíveis PPPs estão setores como saneamento e iluminação pública. Mas locais como a Arena Joinville e a Cidadela Cultural também podem se adequar ao modelo. O processo de capacitação que vem ocorrendo em Blumenau e Joinville é, infelizmente, um exemplo ainda raro em Santa Catarina.

Em 2014, a FIESC fez um roteiro pelas principais cidades do Estado para formular um diagnóstico sobre o potencial de implantação de PPPs e difundir o conceito junto aos gestores públicos. As visitas incluíram questionários, que revelaram grande potencial para criação de projetos, mas, por outro lado, evidenciaram o desconhecimento sobre o tema e a falta de planejamento de longo prazo na maioria dos municípios.

“Na época, 92% dos municípios não tinham planejamento de longo prazo, e isso é vital para concretizar uma PPP. Hoje vemos que não há ainda uma mudança nesta questão”, diz Egídio Martorano, da FIESC. Ele defende a criação de uma cultura de PPPs e concessões que se alinhem a uma política de estado sustentável, capaz de garantir a execução e a manutenção de projetos de médio e longo prazo. “É importante que não haja interrupção no planejamento dos municípios, independentemente das mudanças nas administrações, e é preciso preparo, uma governança, por parte do município”, destaca Martorano.

Porto Itapoá, na Baía da Babitonga: PPP pode viabilizar obras no canal de acesso - Foto: Divulgação

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