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Enchentes e estiagens castigam o Estado

Mudanças climáticas tornam eventos cada vez mais severos, e soluções passam por planejamento, infraestrutura, gestão e proteção ambiental.

Foto: Ricardo Wolffenbuttel/SECOM

Seja pelo excesso ou pela falta de chuvas, Santa Catarina é um estado acostumado a extremos climáticos desde quando há registro. Em 1852, apenas dois anos após os primeiros imigrantes alemães fincarem base onde hoje é Blumenau, colonos registraram uma cheia de 16,4 metros no Rio Itajaí-Açu. Estiagens como a que castigou o Oeste do Estado até pouco tempo atrás também não são novidade. O problema é que as mudanças climáticas têm tornado estes eventos cada vez mais frequentes e severos, e o crescimento populacional faz com que os efeitos sejam sentidos em escala cada vez maior.

Para reduzir os impactos, a construção de barragens e contenção de enchentes em regiões como a da bacia do Rio Itajaí-Açu e a implementação de reservatórios, açudes e cisternas de coleta de água da chuva nas regiões mais afetadas por estiagens, como o Oeste do Estado, são ações essenciais para minimizar os efeitos de eventos climáticos extremos. “Mas é preciso desenvolver uma resiliência hídrica. No caso da estiagem deve-se manter o solo mais úmido, mantendo cobertura vegetal, fazendo rotação de cultura, além de estimular o consumo consciente nas cidades. Já com as enchentes há ainda um problema de macrodrenagem urbana e o fato de muitas cidades terem sido construídas na beira dos rios, seguindo um modelo europeu”, afirma o pesquisador da Epagri/Ciram, Guilherme Xavier de Miranda Junior, especialista em gestão de recursos hídricos.

Blumenau é uma das cidades que se desenvolveu ao longo do rio e paga o preço toda vez que as chuvas se intensificam. Três barragens foram construídas rio acima e, com elas, enchentes históricas como as de 1983 e 1984, quando o rio subiu mais de 15 metros, nunca mais voltaram a castigar o município – em 2008, a cota chegou perto dos 12 metros, mas foram os deslizamentos de terra que devastaram a região. A maior dessas barragens fica em um território indígena no município de José Boiteux, no Alto Vale do Itajaí.

As obras começaram em 1976 e só foram entregues em 1992. Porém, sem receber as contrapartidas prometidas, os indígenas organizaram dezenas de invasões à barragem, e eventualmente equipamentos e instalações são destruídos. Poucas semanas antes da enchente de outubro, o Governo Estadual anunciou investimento de R$ 20 milhões em obras e serviços para a comunidade Xokleng, o que não evitou novos conflitos.

Diante da previsão de uma grande elevação do Itajaí-Açu as comportas foram fechadas, o que evitou o pior em Blumenau e outras cidades. Na sexta-feira 13 de outubro a barragem de José Boiteux verteu – isto é, transbordou – pela primeira vez na história, o que dá uma ideia da quantidade de água acumulada. O fato ocorreu dois dias após a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e o ministro do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, assinarem o Pacto pela Governança da Água com o Governo de Santa Catarina, para melhorar a gestão de recursos hídricos. O Governo anunciou medidas como a dragagem do Itajaí-Açu e a intenção de realizar um mutirão de limpeza dos rios, em parceria com os municípios. Ao mesmo tempo cobra do Governo Federal a inclusão no PAC de obras na região.

Rodovias | A Associação Empresarial de Blumenau (ACIB), junto a outras entidades empresariais da região, vinha cobrando do Governo uma solução para modernizar a barragem de José Boiteux e encerrar o conflito com a comunidade indígena. “A instituição trabalha na efetivação de um Grupo de Trabalho das Barragens de Contenção e Mitigação das Cheias”, diz Christiane Buerger, presidente da ACIB. Ela afirma que instituições do Alto Vale serão convidadas a participar do grupo.

A última enchente sofrida pela região demonstra os prejuízos que eventos climáticos extremos causam para a economia. Até meados de outubro, mais de 40% dos municípios catarinenses haviam declarado situação de emergência por causa das chuvas, e 144 registravam estragos. Além dos graves danos materiais e 27 mil desabrigados, o número de mortos vitimados pelas enchentes chegava a seis no dia 16 de outubro.

Nas rodovias, a Defesa Civil contabilizou dezenas de ocorrências graves, entre deslizamentos de terra, abertura de buracos e fissuras graves, estragos em pontes e inundações em pistas de rolamento. Um dos pontos recorrentemente mais afetados é a BR-280, no trecho da Serra de Corupá, no Norte do Estado. Para se ter uma ideia, 18 deslizamentos registrados desde o final do ano passado até março deste ano custaram cerca de R$ 59 milhões em reparos, contratados em regime de serviços emergenciais. O Complexo Portuário do Itajaí-Açu permaneceu fechado por mais de duas semanas durante as cheias do rio, o que gerou prejuízos milionários para a cadeia produtiva.

Situação em Rio do Sul deixou 1,2 mil desabrigados e município decretou calamidade pública - Fotos: Marco Favero / SECOM

Caminhão-pipa | O Oeste de Santa Catarina também sofre com as chuvas, a exemplo do que acontece nesta primavera, mas são as estiagens que costumam perdurar e causar mais prejuízos. Um dos fatores é a presença maior de propriedades rurais e de uma agroindústria que depende do uso de água não apenas para rodar a operação, mas principalmente para não ficar sem matéria-prima. “A agroindústria é o que se costuma chamar de cadeia empurrada. Se não tiver água em uma indústria têxtil, por exemplo, é possível parar ou diminuir a produção. No nosso caso não. Lidamos com animais vivos, que precisam de água para sobreviver”, explica o diretor executivo do Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados do Estado (Sindicarnes), Jorge Luiz de Lima.

Para mitigar os estragos a agroindústria precisa, muitas vezes, buscar água de caminhão-pipa de outras regiões, como a Bacia do Rio Uruguai. “As grandes empresas ainda conseguem se mobilizar, mas as menores sofrem muito”, pondera Lima. A construção de reservatórios, açudes e cisternas ajuda a garantir água para lavagem e limpeza das áreas produtivas, mas para ser dada aos animais é preciso passar por um rigoroso tratamento, para evitar doenças. Nas indústrias há uma constante busca pela otimização do uso de água potável. “Reduzimos recentemente em um terço o uso de água na produção de carne de frango. Utilizávamos 23 litros de água por quilo de frango e hoje usamos apenas cerca de 9 litros”, revela Lima.

O suprimento urbano também é desafiado pela exaustão de fontes hídricas. A Casan trabalha atualmente no que é considerada a maior obra de sistema de abastecimento de água no Estado. Com investimento de R$ 390 milhões, o Projeto Rio Chapecozinho será composto por uma rede com 58 quilômetros de extensão, atendendo Chapecó, Xaxim, Xanxerê e Cordilheira Alta, cidades que não contam com mananciais de água resistentes às estiagens mais severas.

Obras do Projeto Rio Chapecozinho: suprimento de água é cada vez mais difícil - Foto: Acervo Casan

Menor consumo em aviários

A BRF tem dado atenção especial à missão de reduzir o consumo de água. Em 2022 conseguiu diminuir em 4,29% o volume consumido por tonelada produzida em comparação ao resultado de 2020, ano-base das metas de sustentabilidade da empresa. O objetivo é bem mais ambicioso, no entanto: chegar a 13% de redução até 2025. A meta está atrelada ao sistema de remuneração variável dos executivos.

O caminho para ampliar a economia de água tem sido a adoção de diretrizes para mensurar e monitorar a vulnerabilidade hídrica e o consumo de água nos processos, incluindo iniciativas de reúso e reaproveitamento. Nas operações do Brasil, a proporção de reúso saltou de 11% para 15% nos dois últimos anos. Uma metodologia compara indicadores das diversas unidades para definir prioridades de investimentos em projetos de mitigação de riscos. Só no último ano a companhia investiu R$ 18,4 milhões em tecnologias de automação para as mensurações de água.

A empresa participa ativamente dos Comitês de Bacias Hidrográficas nas regiões em que está presente, e no ano passado devolveu 83% da água captada, devidamente tratada. Na cadeia, embora os produtores integrados sejam responsáveis pela gestão da água em suas operações, a BRF os apoia em adotar tecnologias para aprimorar a utilização. Incentiva, por exemplo, o abastecimento por água subterrânea, o que diminui a exposição à escassez hídrica, pois os lençóis freáticos funcionam como um estoque de água que não é imediatamente impactado pela ausência de chuvas.

Tratamento em unidade da BRF: devolução de 83% da água captada - Foto: Divulgação

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