Enquanto a indústria tem participação de 20,4% no PIB brasileiro, os processos industriais são responsáveis por apenas por 6% das emissões nacionais de gases de efeito estufa. Boa parte da explicação para esse feito está no forte uso de fontes renováveis na geração de energia e a acelerada modernização tecnológica do parque industrial brasileiro, com máquinas e equipamentos cada vez mais eficientes e que consomem menos energia. Enquanto a participação de renováveis na geração elétrica dos países da OCDE está em torno de 18% a 27%, no Brasil as fontes renováveis representam 83% da matriz elétrica.
O presidente da Câmara de Meio Ambiente e Sustentabilidade da FIESC, José Lourival Magri, destaca que, a entidade, por meio do seu Plano de Sustentabilidade para a Competitividade da Indústria de SC, tem em seus objetivos trabalhar as questões relativas às mudanças climáticas, tanto na mitigação quanto na adaptação. “A resiliência da indústria frente às mudanças do clima é primordial, uma vez que estamos numa região onde ocorrem eventos extremos em relação ao clima, como por exemplo, enchentes e períodos de estiagem. Aqui também tivemos o primeiro furacão no hemisfério sul, em 2004. A indústria catarinense, fazendo frente e indo ao encontro do acordo de Paris, é exemplo no Brasil em relação à reciclagem de materiais, em especial plásticos, papeis e papelão e metais ferrosos e não-ferrosos", afirmou.
Ele observa que a indústria de alimentos, especialmente as empresas ligadas ao agronegócio e à produção de proteína animal, vem, a cada dia, aumentando os controles para evitar gases de efeito estufa, em especial o metano, por meio da produção de biofertilizantes e o uso destes gases na produção de energia, no próprio processo industrial ou na criação dos animais. Outro exemplo de destaque é o uso racional da água: a indústria de transformação e o segmento têxtil vêm reduzindo o seu uso ou reutilizando o que evita a escassez e conflitos em períodos de estiagem prolongado.
Magri informa ainda que Santa Catarina possui 38% (3,62 milhões de hectares) de seu território com florestas nativas e 10,5% (1 milhão de hectares) com florestas plantadas, segundo dados do levantamento florestal, realizado pela Furb/Udesc em 2020. Estas, principalmente formada por pinus e eucaliptos, que são utilizados nas indústrias madeireira e de papel e celulose, que são responsáveis por armazenar carbono na ordem de 25 milhões de toneladas de CO2 por ano. "Além disso, os resíduos desta atividade são utilizados na geração de energia térmica e elétrica, evitando a emissão de cerca de 500 mil toneladas de CO2 por ano. Quando comparamos com as emissões do Estado, considerando que cada habitante emite 2,24 toneladas por ano, as emissões são da ordem de 15,6 milhões toneladas por anuais. Com isso, temos no em Santa Catarina apenas nas florestas plantadas uma absorção de 10 milhões de toneladas além do que são emitidas", explica.
“Há décadas, a sustentabilidade está na estratégia da indústria brasileira, que não só usa a matriz energética a seu favor, mas está constantemente se atualizando para aumentar sua eficiência”, explica Mônica Messenberg, diretora de Relações Institucionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Para mostrar os feitos do setor em prol da transição para uma economia de baixo carbono, a CNI fez um levantamento de iniciativas e indicadores de seis setores – cimento, alumínio, vidro, papel e celulose, químico e aço –, responsáveis por 85% das emissões do setor.
“Mesmo emitindo menos CO2 equivalente na comparação com empresas de outros países, a indústria brasileira vem construindo metas cada vez mais ambiciosas”, destaca Davi Bomtempo, gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, responsável pelo levantamento. Confira os principais destaques do relatório:
Setor cimenteiro brasileiro é o que menos emitiu gases de efeito estufa nos últimos anos
A indústria cimenteira, globalmente, responde por cerca de 7% de todo o CO2 equivalente emitido pela ação humana. Já no Brasil, a participação do setor nas emissões nacionais é de 2,3%, cerca de um terço da média mundial. As cimenteiras brasileiras são as que emitiram menor quantidade de gases de efeito estufa por tonelada de cimento produzida desde 1990, quando se iniciou a contabilização de emissões pelo setor. Enquanto a média mundial de emissão específica encontra-se hoje em cerca de 634 quilos de CO2 equivalente por tonelada de cimento, no Brasil esse valor é de 564 quilos por tonelada de cimento – ou 11% a menos.
O esforço de redução das emissões no setor se deve a três fatores, principalmente: uso de matérias-primas alternativas ao clínquer – chamadas de adições -, como escórias siderúrgicas, cinzas de termoelétricas e pó de calcário; uso de combustíveis alternativos, como biomassas e resíduos; e medidas de eficiência energética, ao investir em linhas e equipamentos de menor consumo térmico e elétrico. Essas medidas foram responsáveis pela redução de 18% na intensidade de carbono do setor de 1990 a 2019, enquanto a produção de cimento cresceu cerca de 220%.
Mesmo a indústria cimenteira brasileira sendo a que apresentou melhores resultados na redução de emissões nos últimos anos, ela continua com metas ainda mais ambiciosas para o futuro. Lançou em 2019 o Roadmap Tecnológico do Cimento, em parceria com a Agência Internacional de Energia (IEA), o Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD) e a Corporação Financeira Internacional (IFC) - do Banco Mundial. A meta do setor é reduzir as emissões atuais - que já são referência internacional - em mais 33% até 2050. “Com isso evitaríamos lançar 420 milhões de toneladas de CO2 equivalente na atmosfera”, prevê Paulo Camillo Penna, presidente da Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP) e do Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (SNIC).
Segundo Penna, as metas da indústria cimenteira brasileira estão plenamente alinhadas às do Acordo de Paris. Entre as principais iniciativas do setor está elevar o uso de adições de 32% para 48% e substituir o uso de combustíveis fósseis por alternativos dos atuais 23% para 55% até 2050. “Os níveis da Europa de uso de combustíveis alternativos já estão em cerca de 50% hoje”, comenta Penna.
Florestas do setor de celulose e papel removem e estocam carbono da atmosfera
Papel e celulose é dos principais setores que contribuem para o enfrentamento às mudanças climáticas, seja na redução de emissões ou aumento de remoção de gases de efeito estufa. Enquanto 9 milhões de hectares são destinados ao cultivo de árvores para fins industriais, outros 5,9 milhões de hectares são preservados em florestas nativas, entre Áreas de Preservação Permanente (APP), Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) e Reserva Legal (RL), por exemplo.
Juntas, essas áreas estocam 4,48 bilhões de CO2 equivalente. “Todo esse trabalho no campo é realizado por meio de manejo sustentável, atestado pelo FSC (Forest Stewardship Council) e PEFC/Cerflor, sistemas internacionais de certificação com grande credibilidade”, completa o embaixador José Carlos da Fonseca, diretor executivo do Ibá.
Para dar uma ordem de grandeza, o estoque de carbono das florestas plantadas do setor é superior ao que o Brasil emitiu em 2016, que somou aproximadamente 1,47 bilhão de toneladas de CO2 equivalente, segundo a Quarta Comunicação Nacional que reporta dados à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima.
No processo fabril, também há um cuidado especial. As fábricas mais modernas de celulose e papel, por exemplo, produzem a maior parte da energia que consomem. Quase 100% dessa energia produzida vem de fontes limpas. O resultado de tudo isso são bioprodutos, que estocam carbono e são essenciais no dia a dia, como embalagens de papel, lenços, cadernos, livros, papel higiênico, móveis de madeira, pisos laminados, entre muitos.
Segundo Fonseca, os bioelementos vindos das árvores cultivadas estão na fronteira da inovação, dando origem a matérias-primas que substituirão aquelas de origem fóssil em milhares de itens do nosso dia a dia. Além da renovabilidade, o pós-uso também é um diferencial. “Nossos produtos são biodegradáveis, reutilizáveis e recicláveis. A taxa de reciclagem do papel no país, inclusive, é uma das mais altas do mundo, totalizando 66,9% no Brasil”, destaca Fonseca.
Brasil é um dos países que mais reciclam alumínio no mundo
A indústria brasileira do alumínio é um exemplo na mitigação das emissões dos gases de efeito estufa. O uso de alumínio reciclado reduz a pegada de carbono, comparado com o uso de alumínio obtido por meio do minério, e o Brasil está entre as maiores taxas de reciclagem de alumínio do mundo. O alumínio reciclado responde por cerca de 56% do volume total do consumo dos produtos de alumínio no país enquanto a média global é de 26%. No caso das latas de alumínio para bebidas, chega a 97%.
Para a Associação Brasileira do Alumínio (ABAL), o alumínio brasileiro possui vantagens comparativas para um futuro sustentável. “Em relação as emissões de gases de efeito estufa, o Brasil se destaca quando comparado a outros países, por ter a sua matriz energética predominantemente de origem hídrica e renovável, o que traz uma grande vantagem ambiental para a indústria local, conferindo ao alumínio brasileiro uma pegada de carbono cerca de 60% inferior à média mundial”, destaca Valéria Lima, gerente de Mercado e Competitividade da ABAL.
A indústria brasileira tem buscado fornecer cada vez mais produtos de alumínio certificados e com baixa pegada de carbono para fazer frente à demanda de mercados e soluções comprometidas com um futuro sustentável, circular e a caminho da neutralidade carbônica. O setor tem desenvolvido instrumentos voltados para avaliar, certificar e valorizar a dimensão de sustentabilidade do metal, dos produtos e processos. A ABAL e diversas empresas já fazem parte da Aluminium Stewardship Initiative (ASI), uma organização global que define normas para o desempenho de sustentabilidade.
Atualmente, o Brasil é o único país do mundo com 100% da produção de alumina e alumínio primário certificados pelo ASI. “A organização foi criada pela demanda dos clientes. As grandes empresas que consomem o metal querem ter a certificação do fabricante e as indústrias do alumínio estão se adaptando cada vez mais rápido”, ressalta Lima.
Tecnologias do setor de vidro brasileiro estão alinhadas aos padrões mundiais
Os fornos de fabricação de vidro funcionam 24 horas por dia nos 365 dias do ano. Só param depois de um período de sete a dez anos para serem substituídos. No Brasil, como mais de 90% do setor é formado por empresas multinacionais, as tecnologias são substituídas pelo que há de mais moderno do mercado mundial, ou seja, mais eficientes e que economizam mais energia.
“O segredo para maior redução de emissões de gases de efeito estufa no setor está, sobretudo, no forno de fusão do vidro”, comenta Stefan David, consultor da Associação Brasileira das Indústrias de Vidros (Abividro).
Graças a uma tecnologia de ponta, ao uso de gás natural e à reciclagem, a indústria de vidros brasileira tem pegada de carbono muito competitiva em relação a de outros países, que usam principalmente carvão mineral e óleo bruto. A pegada de carbono no setor de vidro plano é menor que a média das indústrias da União Europeia, e na parte de embalagem, equivale ao padrão europeu.
Para avançar ainda mais na redução de emissões, o setor vidreiro aposta, principalmente, no aumento da reciclagem de vidro, que hoje está em torno de 40% no Brasil no setor de embalagem. Em alguns países, como a Suíça, esse percentual chega a níveis acima de 90%. “Com regulamentação e incentivo adequados, o percentual de reciclagem de vidro pode chegar rapidamente a 80%. Quanto mais reciclamos, mais significativamente reduzimos as emissões”, destaca David.
A indústria de embalagem de vidro recicla em torno de 400 mil toneladas de vidro por ano, o que equivale a uma redução de 100 mil toneladas de gases de efeito estufa não emitidas na atmosfera anualmente. Para se ter ideia da economia, um forno de vidro com 100% de caco permite reduzir 40% da energia consumida. O vidro também pode ser reciclado infinitas vezes, sem perdas, ou seja, um quilo de vidro reciclado produz um quilo de novas embalagens. Além disso, como embalagem retornável, o vidro contribui ainda mais para a redução de emissões e geração de resíduo. Em média, cada embalagem retornável tem, em média, 35 ciclos de retorno e reenvase.
Indústria química inova para ser mais sustentável
A indústria química brasileira constantemente inova e desenvolve produtos cada vez mais sustentáveis e com diferenciais competitivos para uma economia de baixo carbono. Entre 2006 e 2016, o setor reduziu em 44% as emissões de gases de efeito estufa por processos industriais.
Esse resultado é fruto do início da operação de uma unidade de abatimento de óxido nitroso (N2O), gás que tem potencial de efeito estufa 265 vezes superior ao do gás carbônico (CO2). Essa unidade de abatimento de N2O é a maior do gênero nas Américas e uma das dez maiores do mundo. Anualmente, é responsável por abater 5 milhões de toneladas de CO2 equivalente por ano.
O setor também investe em iniciativas como a utilização de telas de catalisadores; projetos de integração energética; operações de simbiose ambiental (reaproveitamento energético de gases residuais de empresas vizinhas como combustível para a produção de vapor); captura de CO2 equivalente no processo industrial; substituição das lâmpadas convencionais pelas de tecnologia LED, entre outras soluções.
A Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim) destaca que as principais indústrias químicas mundiais, sejam elas de origem europeia ou norte-americana, possuem plantas industriais no Brasil. Dessa forma, muitas das iniciativas da indústria química nacional na área da sustentabilidade também são realizadas em outros países onde essas empresas atuam.
“A indústria química tem a cultura de compartilhar suas boas práticas em sustentabilidade visando a evolução do setor neste quesito como um todo. O meio ambiente saudável é benéfico a todos e as práticas que promovem a sustentabilidade devem ser compartilhadas para que sejam adaptadas às realidades e políticas ambientais de cada país” ressalta o presidente-executivo da Abiquim, Ciro Marino.
Carvão vegetal na produção do aço: uma inovação brasileira
A indústria brasileira do aço teve iniciativa pioneira de utilizar o carvão vegetal como agente redutor do minério de ferro nos altos fornos para produção de aço com baixa pegada de carbono.
A produção de aço via rota integrada a carvão vegetal é um diferencial do Brasil em relação à siderurgia dos demais países. Cerca de 12% da produção brasileira de aço é obtida a partir do uso do carvão vegetal em substituição ao carvão mineral, segundo o Instituto Aço Brasil.
O carvão vegetal é obtido a partir da madeira extraída de florestas plantadas pelas empresas do setor (biomassa), sendo, portanto, insumo de origem renovável. Ao longo dos anos, as empresas siderúrgicas aprimoraram as técnicas de plantio e manejo sustentável das florestas.
As árvores de espécies de crescimento rápido, prontas para o corte em 5 a 10 anos, são convertidas em carvão vegetal que irá alimentar os altos fornos para redução do minério de ferro a ferro metálico. O sequestro de CO2 durante o crescimento das árvores iguala, ou mesmo supera, o CO2 liberado durante o processo de produção do aço.
As empresas siderúrgicas brasileiras são pioneiras no mundo em relação ao uso de biomassa renovável proveniente de florestas certificadas pelo FSC ou Cerflor. Estas certificações atestam que as empresas fazem uso sustentável das áreas florestadas e também respeitam os direitos dos colaboradores, provendo-os de condições dignas de trabalho.
Com informações da Agência CNI de Notícias