A taxa de desemprego no País, medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ficou na casa dos 12% nos seis primeiros meses deste ano, patamar em que se encontra, com pequenas oscilações, desde o segundo semestre de 2016. Uma análise mais apurada desses dados, que fazem parte da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, revela que a dificuldade de obter trabalho no Brasil compreende realidades diferentes que variam conforme a faixa etária das pessoas. Entre os jovens de 18 a 24 anos, a taxa é duas vezes superior à média nacional e alcança os 25,8% da população economicamente ativa. Já na fase seguinte, dos 25 aos 39 anos, ela cai para 11,1%. “Além dos efeitos da crise econômica, existe um problema estrutural com esse grupo etário, que tradicionalmente tem mais dificuldade em acessar o mercado de trabalho por ter pouca experiência e, em alguns casos, pouca qualificação técnica”, explica a economista Adriana Beringuy, analista da Coordenação de Trabalho e Rendimento do IBGE.
Em Santa Catarina, a desocupação entre as pessoas que estão estreando no mercado de trabalho também é o dobro da taxa geral, mas o problema é menos intenso do que em outros estados. O desemprego catarinense é de 6% – o mais baixo entre as unidades da Federação e a metade da média nacional. Na faixa etária dos 18 aos 24, chegou a 12% no segundo trimestre de 2019. “Na Região Sul como um todo e em Santa Catarina em particular, a indústria e a agricultura exibem uma capacidade de geração de empregos superior à de outros estados, beneficiada também pela escolaridade mais alta da mão de obra”, afirma Beringuy. No extremo oposto estão estados como Amapá, onde a taxa de desemprego chega a 16,9%, e Sergipe com 15,9%.
A rotatividade no emprego é um problema adicional para os jovens trabalhadores: o grupo é o mais propenso a ser demitido e o que mais enfrenta dificuldades em encontrar uma nova ocupação. Mas a barreira mais significativa que enfrentam é, de longe, conseguir o primeiro emprego, observa o economista Carlos Henrique Leite Corseuil, da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).
“O primeiro emprego é mais difícil do que os subsequentes. Com a dificuldade de furar essa barreira, muitos jovens acabam se empregando em postos de má qualidade ou vão para trabalhos informais”, diz Corseuil, ressaltando que o prejuízo não se limita a esse momento inaugural, mas pode ter consequências de longo prazo, pois quem ingressa no mercado por uma porta de entrada de pior qualidade acaba tendo uma perspectiva de carreira menos promissora do que um jovem que começa em um bom emprego formal.
Jornada parcial | O avanço do desemprego no País, a partir de 2015, tornou ainda mais árdua a tarefa dos jovens que chegaram desde então ao mercado de trabalho, porque as empresas preferem preencher as poucas vagas abertas com profissionais experientes. A novidade no cenário é que a reforma trabalhista, em vigor desde o ano passado, abriu perspectivas novas. Segundo o IPEA, está havendo um aumento do ingresso dos jovens no mercado por meio de novas modalidades de contrato criadas na reforma. A jornada parcial, por exemplo, permite conciliar trabalho e estudo e pode ser interessante para o jovem. “O trabalho intermitente, ao contrário, é muito incerto. De todo modo, ainda não é possível avaliar se as empresas estão mesmo apostando nessas modalidades ou se só recorreram a elas por causa da crise”, diz Corseuil.
A retração da economia levou muitos trabalhadores a aceitar postos de trabalho abaixo de sua qualificação, recebendo salários bem menores do que almejavam ou auferiam no passado. Com os profissionais jovens, o problema é ainda mais agudo. Um estudo publicado pelo IPEA no final do ano passado mostrou que 44% dos jovens de nível universitário empregados no País ocupavam vagas abaixo de sua qualificação – em 2014, o índice era de 38,1%.
Já para a maioria dos jovens de baixa qualificação, nem mesmo essas opções desfavoráveis estão disponíveis – e a realidade deles é a da precariedade e do desalento. De acordo com dados da PNAD Contínua, o desemprego entre profissionais com nível superior completo está na casa dos 5% – já entre os indivíduos com ensino médio incompleto o índice chega a 20%, o mais alto entre todos os níveis de instrução.
Para Fabrizio Machado Pereira, diretor regional do SENAI/SC, o esforço da entidade em oferecer qualificação profissional, por meio de cursos de curta duração, e formação técnica e superior tem cumprido um papel crucial para reduzir o desemprego entre os jovens no Estado. Cerca de 229 mil jovens catarinenses entre 15 e 29 anos, o equivalente a 14% do total nesta faixa etária, se encaixam no conceito do ‘nem-nem’, ou seja, nem estudam nem conseguem arrumar emprego – uma armadilha que atinge geralmente jovens que não desenvolveram nem mesmo competências básicas na trajetória escolar.
“Apenas os programas do SESI e do SENAI para a faixa etária dos 15 aos 29 anos de idade beneficiam quase 88 mil jovens. Esses estão fora das estatísticas do ‘nem-nem’. E a maioria dos que se qualificaram conosco está trabalhando na área do curso em que se formou”, observa Pereira. Segundo dados do SENAI válidos para todo o Brasil, 80% de seus técnicos conseguem ingressar no mercado até um ano após a conclusão do curso. No caso das formações de nível universitário, o índice de empregabilidade chega a 90%.
Cibernética | Por trás dessas estatísticas há exemplos como o de Raissa Marcon Constante, de 24 anos, que fez um curso técnico do SENAI em Tubarão em 2012 e concluiu em 2017 a graduação em Tecnologia em Redes no SENAI, em Florianópolis. Em fevereiro de 2016, quando ainda faltava um ano e meio para o final da faculdade, Raissa começou a trabalhar na Teltec Solutions, uma empresa de tecnologia com 110 funcionários sediada em Florianópolis, e continua lá. Especialista em segurança cibernética, Raissa nunca parou de investir em sua formação. Em 2015, quando ainda fazia graduação e era estagiária no próprio SENAI, ela foi a primeira brasileira a vencer uma etapa latino-americana da competição mundial de rede de computadores realizada pela gigante da tecnologia de informação Cisco.
“Eu ficava muito tempo nos laboratórios do SENAI, onde fiz minha preparação.” Em agosto passado, Raissa conquistou medalha de bronze na WorldSkills, competição internacional de educação profissional disputada na Rússia, na categoria segurança cibernética. “A empresa me apoiou e o treinamento agregou muito ao meu trabalho. Mas a rotina era intensa: trabalhava de dia e me preparava no período noturno”, conta. Na Teltec Solutions ela vem ganhando responsabilidades como a orientação de estagiários e jovens aprendizes, e pretende continuar a investir no aperfeiçoamento de seu currículo.
A trajetória do engenheiro Luan Costa dos Santos, de 23 anos, também sinaliza o impacto de uma boa formação na empregabilidade dos jovens. Em 2012, ele concluiu o ensino médio e técnico em automação industrial no SENAI em Lages. Com bom desempenho, conquistou um estágio de dois anos no próprio SENAI, durante o qual se preparou para a etapa nacional da Olimpíada do Conhecimento, promovida anualmente pela entidade – conquistou a medalha de prata em 2014, com um projeto sobre eletricidade industrial, sua especialidade. Na volta, foi contratado como instrutor de cursos técnicos e, em paralelo, fez um curso de graduação em engenharia elétrica na Universidade do Planalto Catarinense (Uniplac).
Um colega de faculdade que é gerente de uma companhia de alimentos congelados, a Vossko do Brasil, sediada em Lages, convidou-o para trabalhar na indústria em 2017, em um cargo de técnico em eletricidade industrial. Segundo o jovem engenheiro, sua formação de técnico é mais valorizada no mercado atualmente do que a formação universitária. “Conheci muitas pessoas que saem da faculdade e não conseguem trabalho. No meu caso, a bagagem prática que o curso técnico propicia é exatamente o que as empresas precisam”, afirma.
Cursos de educação profissional e tecnológica ampliam a empregabilidade dos jovens quando a sua oferta está alinhada com as demandas dos empresários. O SESI e o SENAI levam isso em conta na hora de montar sua grade de cursos técnicos e de qualificação profissional. “São programas adaptados para as necessidades das diferentes regiões do Estado”, diz Fabrizio Pereira.
Por Fabrício Marques