O verbo incluir permite diferentes aplicações em variados contextos. Quando se fala em uma atividade da complexidade da indústria, que envolve variáveis como pessoas, tecnologias, meio ambiente, mercado, ambiente de negócios e tantas outras, tendo como pano de fundo um cenário de grandes transformações, pode-se entender a inclusão como a capacidade de articulação de todos esses fatores para se estar no mundo de forma harmoniosa, competitiva e construtiva. Parece complicado, mas a ideia central é simples, óbvia até: para que pessoas e empresas se incluam com sucesso no universo produtivo elas necessitam ter as competências adequadas, qualidade de vida e equipes bem geridas. Além, é claro, de ambientes favoráveis, em empresas e comunidades, que ofereçam oportunidades de empreender, trabalhar e superar limitações. É neste contexto amplo que a FIESC se posiciona como um ponto de apoio para a completa inclusão da indústria e dos trabalhadores catarinenses na nova economia.
“A indústria irradia prosperidade. As cidades industrializadas são as que possuem maior índice de desenvolvimento humano”, afirma Mario Cezar de Aguiar, presidente da FIESC, sublinhando o papel da indústria para o desenvolvimento de Santa Catarina. “Indústrias e trabalhadores enfrentam o desafio de se manter competitivos para não perderem o que já conquistaram e para se habilitarem a novas conquistas. É a isto que chamamos inclusão, uma condição que buscamos proporcionar à sociedade por meio de nossos serviços”, define Aguiar. Jaraguá do Sul, uma das cidades mais industrializadas de Santa Catarina, se encaixa neste conceito graças à opulência de pequenas e grandes indústrias como WEG, Duas Rodas e Marisol. A cidade pode ser considerada um oásis dentro de um país repleto de problemas. Ainda que o setor público enfrente dificuldades, o desenvolvimento humano é muito alto, o desemprego é relativamente baixo e o índice de segurança é o mais elevado do País entre as cidades com mais de 100 mil habitantes – Jaraguá tem 167 mil. As coisas são assim em grande parte devido à inclusão proporcionada pela indústria, com a parceria das entidades ligadas à FIESC.
Customização
A Marisol, grande indústria do vestuário, varejista e gestora de marcas de moda infantil, é uma empresa “antenada” nas transformações do mercado e do mundo do trabalho. Comandada por Giuliano Donini, de 44 anos, a empresa se molda de acordo com a visão aberta do jovem líder empresarial. Mudanças de comportamento social são um tema permanente em seu radar. Para ele, o grande desafio para manter a marca relevante é lançar um olhar abrangente em relação a como as pessoas e a sociedade estão se comportando no mundo de hoje. “Se eu acredito que há uma mudança no comportamento humano, precisamos entender na Marisol que o colaborador já não é o mesmo, nem o consumidor. Se eles não são os mesmos, o que devemos fazer para contratar, para vender? Não dá para projetar os negócios do futuro sem pensar de forma sistêmica”, analisa.
O sucesso inconteste de suas marcas Marisol, Lilica Ripilica e Tigor T. Tigre, além de um inovador investimento em valorização de ativos intangíveis, inclui a companhia no topo do mercado do vestuário. Mas diversas ações voltadas ao público interno e à comunidade também tornam a Marisol especial – e ainda mais competitiva. A empresa é uma das pioneiras em implementar um amplo projeto de gestão de saúde corporativa, que vai muito além das obrigações legais em segurança e saúde no trabalho. Batizado de Quero + Saúde Marisol, o programa utiliza plataforma desenvolvida pelo SESI – o Planeja Saúde – que é capaz de investigar e mapear toda a “população” da empresa, identificando grupos de riscos e fornecendo os caminhos para lidar especificamente com cada um, na forma de programas customizados, considerando o melhor retorno para a empresa e o trabalhador. A evolução da saúde e da produtividade são medidos frequentemente, criando um ciclo de melhoria contínua.
“Essa é uma nova agenda que inclui pessoas no mundo do trabalho e empresas no mundo da competitividade. Se as pessoas não são saudáveis e integradas no trabalho apresentam baixa produtividade, baixo engajamento e correm o risco de perder o emprego”, diz Fabrizio Machado Pereira, diretor da FIESC. “Para as empresas, além de funcionários mais produtivos, as vantagens são a redução nos custos com saúde e um passaporte para o futuro, porque o tema tende a se tornar uma barreira comercial para transações com outros países”, complementa.
Aos 25 anos, Dirceu Kickhoefel pesava 113 quilos. A professora de ginástica laboral da Marisol, onde trabalha, o convidou para participar de um desafio intitulado Medida Saudável, proposto pelo setor de Recursos Humanos, e ele, que recém-começara a praticar exercícios em uma academia, encontrou mais um motivo para se cuidar. O desafio era uma das primeiras novidades do programa Quero + Saúde Marisol, desenvolvido a partir de pesquisa feita em 2017 com 98% dos 2.400 funcionários em Jaraguá do Sul e também na unidade de Pacatuba, no Ceará. O projeto foi lançado em janeiro de 2018, e no final deste ano representará Santa Catarina em uma premiação mundial na Austrália – o Prêmio Global de Local de Trabalho Saudável, promovido pela Global Centre for Healthy Workplaces.
O Quero + Saúde atua em várias frentes: além das questões mais comuns relacionadas à saúde, como alimentação saudável, gestão de doenças crônicas e exercícios físicos, trabalha também no desenvolvimento de lideranças e em ações de engajamento com a comunidade.
Os investimentos em saúde diminuem o absenteísmo, elevam a produtividade e reduzem a rotatividade. Entre 2017 e 2018, a Marisol baixou de 14,2% para 3% o número de riscos de alto grau nos postos de trabalho. Os pedidos de demissão caíram, demonstrando um desejo maior dos trabalhadores em permanecerem na empresa. Em 2018, uma nova pesquisa para avaliar o impacto das ações do programa revelou um aumento no Índice de Bem-Estar dos colaboradores de ambas as plantas da empresa.
Foi neste contexto que Dirceu perdeu 33 quilos e 25 centímetros de circunferência abdominal e conquistou o primeiro prêmio do Desafio Medida Saudável, em agosto de 2018. Além da academia, começou a se alimentar de maneira mais consciente e passou a caminhar 5 quilômetros todos os dias até o ponto de ônibus do bairro vizinho, onde então embarca para completar os outros 10 quilômetros de distância até a sede da Marisol. Ele ajuda a família a cuidar da chácara em Rio da Luz, um dos bairros mais antigos de Jaraguá do Sul. “Meu pai ficou doente este ano, e se eu ainda pesasse 113 quilos não poderia tocar as coisas na chácara. E também não conseguiria fazer meu trabalho aqui na empresa como venho fazendo. É outra vida”, reconhece Dirceu.
Além dos cuidados com a saúde dos funcionários, a Marisol também trabalha de forma estratégica para reter talentos. Muito antes da discussão atual sobre como se manter relevante no mercado de trabalho, a empresa jaraguaense já promovia com frequência o job rotation, ou seja, a oportunidade de trocar de área dentro da companhia. O hoje gerente de engenharia Carlos Rodrigo Figur entrou na empresa aos 18 anos como estampador. Prestes a completar duas décadas de Marisol, o engenheiro químico já passou por uma série de cargos de gestão em setores tão distintos quanto logística e marketing. “Isso me proporcionou uma visão sistêmica. Também fui instigado a desenvolver várias habilidades: cada uma dessas experiências foi como um emprego novo. Em termos de currículo, isso agrega muito. E para a empresa, ter alguém que já conhece o ambiente mas traz um olhar diferente para outra área sempre é vantajoso”, avalia Carlos. Cursos de capacitação e de educação continuada estão entre as ferramentas utilizadas pela empresa para elevar os resultados da rotação de funções.
Zona azul
O presidente da Marisol comporta-se como um embaixador da boa saúde não apenas na empresa mas também na comunidade, trabalhando de forma voluntária em projetos como o Jaraguá Mais Saudável, que visa transformar a cidade em uma das mais longevas do País: uma blue zone, como são chamadas as regiões do mundo onde as pessoas vivem mais tempo, e com saúde. Segundo Donini, nas 44 cidades que já são blue zones no mundo a produtividade da economia é maior e os imóveis aumentam cerca de 12% em valor. “Em alinhamentos de interesses, a sociedade escolhe um novo jeito de viver e há benefícios econômicos e sociais para todos”, diz o empresário.
Dentre as iniciativas comunitárias da Marisol destacou-se o fato de levar para os domínios da empresa o evento Corrida do Bem farmaSesi no final de 2018, que contou com a participação de mais de 1.500 pessoas, dentre eles o próprio Donini e sua diretoria, tendo a largada acontecido dentro do parque fabril. “Não adianta buscar excelência na empresa se da porta para fora está tudo bagunçado. As pessoas trazem tudo que vivem aqui para dentro, inclusive os problemas. Trabalhar para melhorar o ambiente externo ajuda no ambiente interno. Isso tudo vai gerando um maior vínculo e pertencimento das pessoas com o ambiente de trabalho”, avalia Donini.
É nesse espírito de inclusão por meio da saúde que o SESI lança um serviço inovador em Jaraguá do Sul, o MedSESI, uma clínica voltada à atenção primária à saúde (APS) para atender trabalhadores de diversas indústrias – a Marisol é uma das parceiras. Estudos piloto têm demonstrado que a APS é mais eficiente e mais barata do que o sistema voltado ao tratamento de doenças já estabelecidas. A lógica é a mesma dos médicos da família: é o primeiro contato com o sistema de saúde e inclui o acompanhamento de cada pessoa por equipe de profissionais, focando em evitar o surgimento de doenças. Somente depois dessa triagem é que a pessoa é encaminhada, se necessário, para outros níveis de serviços de saúde como exames, tratamentos ou internações. “Para as empresas o custo é baixo e o resultado é a diminuição dos índices de absenteísmo”, afirma Marco Goetten, diretor de saúde do SESI-SC.
Por Vladimir Brandão e Leo Laps